19.11.09

Argentina aceita negociar barreiras com Brasil

DCI (SP)

Karina Nappi


SÃO PAULO - A pressão imposta ao governo argentino após a decisão brasileira de colocar licenças não automáticas para 30 produtos do país vizinho, em represália às medidas protecionistas a 411 produtos brasileiros, surtiu efeito. Durante a reunião entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e sua par Argentina Cristina Kirchner foi definida a formação de uma comissão ministerial que a cada 45 dias tratará das pendências no comércio bilateral. De acordo com o presidente da Associação Brasileira de Comércio Exterior (Abracex), Roberto Segatto, os integrantes brasileiros que irão comandar as negociações serão os secretários executivos do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Ivan Ramalho e Welber Barral.

"Tanto o Barral quanto o Ramalho são as pessoas mais indicadas para negociar com os respectivos executivos argentinos, uma vez que eles possuem maior conhecimento no setor de comércio exterior, estão diretamente ligados aos empresários brasileiros, além de possuírem maior jogo de cintura político e social para conseguirem o que querem. Haja visto as vitórias conquistadas pelo Ramalho na última visita à Argentina", relatou Segatto.

Segundo declaração divulgada pelo Itamaraty, os presidentes do Brasil e da Argentina reconhecem, indiretamente, que cometeram atos irregulares em relação às normas da Organização Mundial do Comércio (OMC) sobre aplicação de licenças não automáticas nas importações. Ambos os chefes de estado se propuseram a agilizar os processos de licenças não automáticas.

No primeiro ponto do comunicado, a Argentina se compromete a expedir as licenças não automáticas em até 60 dias, a partir do começo de 2010. Trata-se do prazo previsto pela OMC, que conforme afirmou o ministro do Desenvolvimento Miguel Jorge, a Argentina ultrapassava em até três vezes o limite, demorando em torno de 180 dias para emitir as licenças a importadores de produtos brasileiros.

Outro tópico do documento aponta que o Brasil se compromete a informar a Argentina sobre a adoção de licenças não automáticas com prazo prévio de 21 dias. Obrigação informada pela OMC que não foi adotada pelo Brasil quando aplicou as licenças não automáticas aos produtos argentinos, no mês passado.

Ainda no comunicado, os dois países se comprometem a realizar um "monitoramento estrito" para evitar a ocorrência de desvios de comércio. Concordam, também, em apresentar uma proposta sobre a Lista de Exceção da Tarifa Externa Comum (TEC) e avaliar a oferta exportável do Mercosul. Outro tópico prevê a realização de um esforço conjunto para que o Protocolo de Compras Governamentais do Mercosul passe a vigorar, além de apresentar o compromisso dos dois países em adotar ações de integração produtiva e reuniões entre os presidentes a cada 90 dias.

Para Segatto, a posição dos presidentes ao reconhecerem os erros comerciais é bastante positiva para a continuidade do Mercosul como um bloco econômico. Contudo, a demora para o enquadramento do prazo para a emissão das licenças não automáticas por parte da Argentina deve ser visto como uma possibilidade de que o governo Kirchner não cumpra sua parte em 2010.

"Há um grande mercado entre o Brasil e a Argentina, temos que trabalhar de mãos dadas, eu espero que mesmo com a proposta para o próximo ano, a Argentina cumpra a parte dela pela primeira vez em contratos bilaterais. Os empresários argentinos estão preocupados, contudo, otimistas que as relações irão se resolver. E os empresários brasileiros acreditam que caso não seja cumprido o acordo feito ontem pelos presidentes, o Brasil poderá ser mais duro e impor um freio maior aos produtos argentinos que entram no País ou até acabar de uma vez com o Mercosul e realizar acordos comerciais", explicou Segatto.

O presidente Lula afirmou ainda em discurso que como somente em 2010 serão reduzidos os prazos argentinos para a importação de eletroeletrônicos, calçados, têxteis e outros setores brasileiros, o Brasil permanecerá com a imposição das medidas aplicadas no comércio bilateral, no caso a necessidade de emissão de licenças não automáticas para os 30 produtos argentinos.

Como demonstração do espírito de conciliação nos dois governos, o Brasil anunciou a liberação de importação de vacinas antiaftosa da Argentina, após mais de dez anos de proibição, e os argentinos retiraram a exigência, aos exportadores brasileiros, de vistos consulares que atrasavam e encareciam a venda de produtos como móveis.

Acordos

Logo após a reunião Lula e Cristina assinaram memorando de entendimento sobre cooperação na área de farmacopéias, acordo de facilitação turística na fronteira Foz do Iguaçu-Puerto Iguazú e complemento ao acordo de cooperação técnica para implementação do projeto de fortalecimento do Programa de Controle da Dengue.

Os dois países também divulgam nota sobre o convênio de cooperação entre a Eletrobrás e a Ebisa para estudo técnico-econômico e ambiental destinado a um segundo aproveitamento hidrelétrico no Rio Uruguai.

Além disso, a Embraer vai vender 20 aviões modelo 190 AR para o governo argentino.

A compra envolve cerca de US$ 700 milhões. Parte do financiamento, cerca de 85%, será realizado via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o restante por meio do Banco de la Nación. Todas as aeronaves serão entregues até 2011.

De acordo com Lula, o BNDES é um parceiro entusiasta da integração da parceria bilateral. Segundo ele, desde 2005, foi desembolsado US$ 1,2 bilhão para projetos de ampliação e modernização da infraestrutura da Argentina e seu parque produtivo.

Lula afirmou também que o Brasil investirá mais US$ 1 bilhão em gasodutos, saneamento e abastecimento de água argentinos. Lula disse ainda que há projetos comuns em estudo envolvendo cerca de US$ 4,5 bilhões.

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