16.12.09

Varejo é pretexto para puxada no juro

16 de dezembro de 2009

Valor Economico (SP)

Luiz Sérgio Guimarães


A pesquisa de comércio divulgada ontem pelo IBGE mostrou que a demanda está mais aquecida do que os economistas esperavam. Os analistas previam alta de 0,7% sobre setembro. Veio o dobro, crescimento de 1,4%. Mas os dados se referem a outubro. E hoje se vive o frenesi consumista pré-Natal. O varejo já está bombando desde outubro e, mesmo assim, a inflação não acorda. Permanece sedada pelas importações. A febre de consumo é esfriada pelos produtos vindos de fora. A recessão externa brava e a apreciação cambial barateiam muito os importados. É por isso que hoje o principal problema brasileiro se refere ao crescente déficit em transações correntes. Não é a inflação. Dificilmente o Banco Central irá subir a Selic preventivamente porque a demanda, embora suprida por artigos estrangeiros que podem se tornar menos abundantes se a recuperação da economia mundial ocorrer de forma súbita e imprevista , está aquecida.

Mesmo assim, como os players que fazem negócios no mercado futuro de juros da BM&F de bobo não têm nada, as projeções de CDI ganharam mais prêmios. A taxa para o final do ano que vem avançou de 10,36% para 10,42%. O contrato com vencimento em janeiro de 2012 evoluiu de 11,79% para 11,85%. E o swap de 360 dias passou de 10,26% para 10,32%. Como surpreenderam, as vendas varejistas conseguiram espantar o marasmo do primeiro dia de negócios da semana. E o giro cresceu 284%, para 453 mil contratos.

Os fatores que impulsionam o comércio não têm a capacidade de desencadear um aperto monetário. Podem ser condição necessária, mas não suficiente. A demanda deriva dos estímulos fiscais, do mercado de trabalho (o dado do Caged que sai hoje será lido com atenção), confiança do consumidor (garantia de emprego e renda) e crédito. Estas variáveis só atuam para reduzir o hiato do produto e fazer a economia trabalhar acima do seu potencial se os importados não conseguirem ocupar o espaço dos nacionais enquanto os investimentos produtivos estiverem em processo de maturação. O mundo está louco para vender para o Brasil. E este, dono de uma moeda valorizada, muito propenso a comprar. O BC não tem muito o que fazer a respeito disso, a não ser que o dólar comece a subir contra o real. Após acumular baixa de 1,5% nos três dias anteriores, ontem o dólar subiu 0,57%, para R$ 1,7540.

O volume de negócios persistiu expressivo no interbancário à vista, apesar de ter tombado de US$ 5,1 bilhões para US$ 3,5 bilhões. Muitas operações de vulto de entrada e saída fizeram o dólar oscilar entre a mínima de R$ 1,7490 e a máxima de R$ 1,7680, mas a tendência primária veio dos EUA mesmo. Dados americanos sobre inflação e atividade deixaram os investidores inseguros a ponto de buscar refúgio em ativos de renda fixa denominados em dólar. As bolsas de Wall Street fraquejaram durante a maior parte do dia porque reentrou em cena o fantasma da estagflação. O indicador relativo à inflação no atacado assustou. O Índice de Preços ao Produtor (PPI, na sigla em inglês) acusou alta de 1,8% em novembro, número bem acima tanto da taxa de outubro, de 0,3%, quanto das expectativas, de 0,8%. O core (para a obtenção do qual se retira a evolução dos preços de alimentos e de energia) subiu 0,5%. Os preços de energia apresentaram alta chocante, de 6,9%. Os varejistas conseguirão repassá-la para os consumidores? Parece que não. A pesquisa Empire State - índice geral de condições para os negócios - realizada pelo Fed de Nova York, registrou neste último mês do ano inesperada queda para o patamar de 2,55, ante 23,51 um mês antes. Isso abalou os analistas, pois esperavam alta para 23,9.

Como o dólar está longe do piso de R$ 1,70 defendido pelo governo e como o ministro da Fazenda considera a questão cambial superada, os hedge funds começaram a desmanchar as posições montados nos pregões de derivativos cambiais da BM&F contra a possibilidade de adoção de novas providências fiscais e administrativas destinadas a evitar uma sobreapreciação do real. O desmonte reduziu as posições "compradas" em dólar (as que seriam beneficiadas em caso de pacote para estancar a queda da moeda americana) de US$ 8,283 bilhões no dia 11 (sexta-feira) para US$ 7,34 bilhões na segunda. As posições compradas haviam subido de US$ 3,99 bilhões no dia 3 para até US$ 8,94 bilhões no dia 10.

Luiz Sérgio Guimarães é repórter de finanças

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