Valor Economico (SP)
Ásia: Para analistas, tendência é Pequim se acomodar com a situação
Dexter Roberts, BusinessWeek, de Pequim
Foi um ano duro para a siderúrgica Baotou, da Mongólia Interior. As receitas da companhia, sediada nas pradarias varridas pelo vento, 560 quilômetros a noroeste de Pequim, caíram 21%, e a siderúrgica deverá contabilizar o seu primeiro prejuízo desde sua abertura de capital, há quase uma década. A redução nas exportações prejudicou, mas o maior problema tem sido a crescente produção interna. A produção chinesa de aço aumentou 10,5% neste ano, e a capacidade está perto de superar 700 milhões de toneladas métricas anuais - aproximadamente 200 milhões a mais do que a China consome. "O excesso de capacidade está afetando cada companhia no setor", diz Yu Chao, encarregado de relações com investidores da Baotou.
Seria esta a China que deverá crescer em mais de 8% neste ano? Apesar de o pacote de estímulo de US$ 586 bilhões de Pequim ter ajudado o continente a navegar na crise financeira global, há um inconveniente. Investimentos em ativos fixos - o dinheiro gasto em fábricas, rodovias e outros projetos de vulto - dispararam, aumentando 40% no primeiro semestre e responderam pela quase totalidade do crescimento do país.
O crédito fácil ajudou a estimular a demanda por commodities, produtos químicos e vidro. Mas ele também provocou um surto de crescimento em novas fábricas para produzir essas mercadorias. Isso poderá elevar os atritos comerciais, se a China começar a exportar o excedente a preços abaixo da tabela - que os especialistas em comércio exterior chamam de "dumping". Num momento em que a capacidade de produção de aço do continente supera a demanda interna em praticamente 30%, "será que eles fecharão aquelas instalações e demitirão aquelas pessoas, ou encontrarão um jeito de resolver isso pela exportação?", pergunta Daniel R. DiMicco, executivo-chefe da siderúrgica Nucor, sediada em Charlotte, EUA. "A tendência deles é de exportar."
A agência estatal de planejamento da China alerta para um gigantesco excesso de capacidade em seis setores industriais. Fabricantes de cimento acrescentaram 600 milhões de toneladas de capacidade produtiva neste ano aos 1,9 bilhão de toneladas que a China já produzia. Fundições de alumínio estão funcionando a apenas 70% da capacidade, ante 80% no ano passado. E ao longo dos dois anos passados o número de companhias chinesas que produzem equipamento de energia eólica quadruplicou, para mais de 80.
Washington está começando a tomar medidas. A China agora enfrenta impostos aduaneiros que praticamente dobram o preço das exportações de aço tubular para os EUA, depois que o Departamento do Comércio emitiu uma instrução normativa dizendo que Pequim está vendendo os tubos, usados no setor petrolífero, a preços abaixo de custo. "A China continua acrescentando capacidade, ainda que não exista nenhuma necessidade para isso em nenhum lugar no mundo", diz Roger Schagrin, um advogado de Washington que representa as siderúrgicas americanas na queixa sobre os tubos. Eles dizem que as exportações chinesas aos EUA triplicaram ao longo dos três anos passados, para 2,1 milhões de toneladas anuais, apesar de o surto na produção ter se desacelerado desde a publicação da instrução normativa. Fabricantes americanos de papel cuchê (papel revestido usado para impressão colorida de melhor qualidade) apresentaram queixa semelhante.
Pequim também está preocupada com o excesso de produção industrial. Se as companhias que estão acrescentando capacidade fabril não podem vender sua produção excedente, elas correm o risco de não honrar os seus empréstimos. E os planos de desacostumar a China dos seus gastos estatais, criando uma economia inovadora e movida pelo consumo, poderão sofrer, se as companhias continuarem a investir em demasia na produção de commodities. "Precisamos pensar em que a nossa economia deve depender", diz Zha Daojiong, professor da Escola de Estudos Internacionais da Universidade de Pequim. "Preços baixos e maior quantidade ou produtos de maior valor agregado?"
A China adotou algumas providências para refrear a expansão. A agência estatal de planejamento está limitando novos projetos nos setores de cimento, alumínio e vidro que não atenderem padrões rigorosos de controle de poluição, eficiência energética e tamanho. Ela mandou duas importantes siderúrgicas, Baosteel e Wuhan, de Xangai, pararem de construir duas usinas com capacidade anual de 10 milhões de toneladas cada. Também proibiu a construção de fábricas menores produtoras de polissilício (usado em células fotovoltaicas) e monômero de silicone (usado em tudo, de loções para pele a produtos eletrônicos). "Estamos gostando do que o governo chinês está fazendo: eles estão se concentrando em quem está usando os recursos de forma eficiente", diz Tom Cook, da Dow Corning.
Isso não significa que será fácil resolver o problema. A maioria das companhias nos setores mais duramente atingidos são grandes empregadoras, estatais e fontes estratégicas de receitas para governos regionais. Nessa condição, elas desfrutam energia e terras subsidiadas - sem mencionar vínculos próximos com bancos locais. Quando outros países poderiam se permitir comprar o excedente, "a China se livrou dele, mas agora o país é uma panela de pressão com vapor escapando", diz Joerg Wuttke, presidente da Câmara de Comércio Europeia na China.
E a China pode não estar disposta a realizar as mudanças macroeconômicas exigidas para fazer frente ao desafio. Na conferência anual para formulação de políticas públicas realizada em 7 dezembro, o governo insinuou que seus gastos continuariam impulsionando o crescimento por pelo menos um ano. As autoridades também mostraram pouca vontade de valorizar a moeda.
Enquanto isso, os economistas chineses argumentam que o crescimento acabará absorvendo qualquer excesso de produção. "Num ambiente competitivo, o excesso de capacidade produtiva é inevitável", diz Lu Feng, professor no Centro para Pesquisa Econômica da China, na Universidade de Pequim.
(Copyright© 2009 The McGraw-Hill Companies Inc.)
Nenhum comentário:
Postar um comentário