18.12.09

Crise econômica deixa danos psicológicos em americanos

18 de dezembro de 2009

Valor Economico (SP)

EUA: Baixo-astral tem efeitos políticos e cria cicatrizes profundas no país

Gerald Seib, The Wall Street Journal


A crise econômica que continua persistindo já custou aos EUA não só trilhões de dólares em capital perdido. Ela também está cobrando um alto preço da psique nacional, deixando cicatrizes que podem demorar anos para sarar.

Esse dano psicológico tem sérias implicações políticas, com certeza. Ajuda a explicar por que azedaram as atitudes para com o presidente Barack Obama e o Partido Democrata, agora no governo; gerou uma espécie de baixo-astral nacional que traz problemas para políticos de todos os partidos; e é uma das principais razões para o crescente apoio ao tipo de insurreição representada pelo movimento contra gastos governamentais e impostos excessivos chamado "Tea Party", numa referência a uma revolta de colonos americanos no século XVIII contra os impostos da coroa britânica sobre o chá.

Mas em última análise o impacto transcende a esfera política. Basta examinar a mais recente pesquisa de opinião feita pelo "WSJ"/NBC News, e dá para ver o dano causado ao tradicional espírito americano de otimismo. As conclusões levantam uma pergunta mais profunda: Que efeito tem a calamidade econômica sobre a alma de um país?

No mínimo, os resultados sugerem que, agora que um ano excepcionalmente difícil vai chegando ao fim, os lampejos de recuperação que surgem no nível macroeconômico não estão se filtrando plenamente para baixo, até as bases da vida americana.

Depois que os americanos começaram a expressar mais otimismo, em meados do ano, crendo que o país estava novamente tomando a direção certa, essa sensação de otimismo agora parece estar sumindo. Na nova pesquisa, apenas 33% responderam que o país está seguindo na direção certa, menos que os 42% de junho. A maioria respondeu que o país está no caminho errado.

Apesar da desaceleração no corte de empregos e de uma recuperação no mercado acionário, apenas 46% dos respondentes acham que 2010 será melhor para o país do que 2009.

Mais que 4 em cada 10 americanos disseram que consideram extremamente provável perder o emprego, sofrer corte de salários ou bônus, ou ter que aceitar um cargo com salário mais baixo no ano que vem. Um terço disse que uma dessas coisas já aconteceu. Um quarto dos americanos teme um golpe duplo, esperando, ao mesmo tempo, perder renda e ter que assumir os pagamentos da moradia ou dar ajuda financeira a familiares.

Uma recuperação real em 2010 produziria, é claro, resultados mais felizes do que esses americanos preveem. Mesmo assim, talvez nem isso baste para sanar as cicatrizes que parecem ser mais fundas.

Duas em cada três pessoas disseram que não confiam em que a vida para a geração de seus filhos será melhor do que foi para eles próprios. Quase a mesma proporção disse que o país está em declínio.

Nada menos de 39% preveem que a China será o principal país do mundo daqui a vinte anos - comparado com 37% que creem que os EUA serão o país líder.

Peter Hart, pesquisador do Partido Democrata que realizou o levantamento do "WSJ"/NBC News juntamente com Bill McInturff, do Partido Republicano, perguntou simplesmente: "Onde foi parar todo o otimismo?" Jay Campbell, que trabalha com Hart, dá uma resposta parcial: "É difícil ter otimismo quando não se consegue nem pagar as contas".

Um fato marcante quanto a esses golpes ao otimismo nacional é que eles não estão atingindo apenas os americanos de renda mais baixa, que tradicionalmente sentem o maior impacto durante uma recessão econômica profunda. As sementes da dúvida também são vistas entre os que estão no alto da pirâmide dos empregos.

Profissionais liberais e executivos tiveram quase exatamente a mesma probabilidade dos trabalhadores manuais de dizer que não têm confiança em que a vida para a nova geração será melhor, e a mesma probabilidade de dizer que o país está em declínio. Dois em cada dez profissionais liberais disseram que estavam insatisfeitos com sua segurança no emprego.

E com boa razão, pois a atual queda econômica - causada pelo declínio nos mercados financeiros e no valor dos imóveis - foi um duro golpe justamente para a alta classe média, que antes tinha motivos para pensar que poderia estar imune às oscilações da economia.

Uma dessas pessoas é Susan Streck-Moss, profissional de marketing de New Canaan, Connecticut. Depois de trabalhar vários anos em marketing para TV, ela passou para o marketing de marcas empresariais. Há alguns anos sofreu uma séria lesão nas costas e depois tentou voltar à profissão antiga. Isso foi em 2007 - exatamente quando a atual profunda recessão estava começando.

"Eu tinha grandes esperanças", disse ela. "Eu nunca tinha deixado de conseguir um emprego. Nunca fui recusada por emprego nenhum. De repente, era como se eu estivesse procurando trabalho como atriz. Era uma rejeição atrás da outra." Ela ainda não conseguiu encontrar trabalho fixo e entrou em grupos de apoio onde fica conhecendo outros na mesma situação difícil - profissionais liberais que já tomaram duas ou três hipotecas sobre suas casas, esperando em vão que a sorte melhore.

Streck-Moss, de 52 anos, disse que já perdeu a casa e teme perder o apartamento. "Esses são os novos EUA", disse. "São as pessoas que sempre tiveram bons empregos, criaram os filhos, mandaram-nos para a faculdade e fizeram tudo certo. De repente a gente se vê soterrada. É um pesadelo."

Para a economia, o pesadelo talvez esteja terminando. E talvez um fim do pesadelo econômico altere o declínio verificado nas pesquisas em relação aos democratas, que inevitavelmente assumem a maior parte da culpa porque no momento estão governando o país. Saber se uma recuperação econômica vai reacender o espírito do otimismo americano é uma questão inteiramente diferente.

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