20.11.11

A questão dos royalties do petróleo

Mauro Osório

RIO DE JANEIRO: MITOS E REALIDADE

O Rio de Janeiro, a partir da mudança da Capital para Brasília, sofreu um longo processo de perda de participação na economia brasileira. Na mesma direção, a máquina pública no ERJ sofreu uma particular desestruturação, tendo em vista que as cassações, a partir do golpe de 64, atingiram mais o Rio de Janeiro do que qualquer outra região do país. As cassações permitiram a ascensão de Chagas Freitas, pela legenda do MDB, mas com apoio dos militares, criando, desde então, um ciclo vicioso, do qual só começamos a sair a partir de período recente. Isso fez com que, entre inúmeros exemplos, o Rio de Janeiro hoje ainda apresente a mais alta incidência de casos de tuberculose, por cem mil habitantes, entre todas as unidades federativas.

Do ponto de vista econômico, entre 1970 e 2008, o ERJ apresentou uma perda de participação no PIB nacional de 32,1%, a maior entre todas as unidades federativas (tabela anexa).

Na mesma direção, a cidade do Rio de Janeiro apresentou, no mesmo período, uma perda de participação no PIB brasileiro de 60,2%, a maior entre as capitais (tabela anexa).

A partir de 1995, alguns investimentos começaram a chegar ao estado do Rio de Janeiro, como a indústria automobilística que se instala no Vale do Paraíba, e ocorreu um forte crescimento na extração de petróleo na Bacia de Campos. Isso não criou, no entanto, números brilhantes para o ERJ. No que se refere à participação no PIB, apesar do forte efeito gerado pela extração de petróleo, a partir de 1995 apenas deixamos de perder participação na economia nacional.

No que diz respeito à evolução do emprego, no período entre 1995 e 2010, continuamos na lanterna, entre todas as unidades federativas. Nesse período, o crescimento do emprego formal no ERJ foi de 51,8%, contra um crescimento no total do país de 85,5%. Mesmo no setor serviços, o crescimento do emprego formal no ERJ foi o terceiro menor entre as 27 unidades federativas (tabela anexa).

O Rio de Janeiro, em período recente, principalmente a partir dos últimos dois anos, melhora significativamente, com os mega investimentos e mega eventos e a retomada de obras públicas realizadas em parceria do Governo do Estado com o Governo Federal e as Prefeituras. Além da reestruturação da máquina pública estadual já iniciada pelo Governo do Estado.

No entanto, do ponto de vista econômico e do emprego, apenas encostamos na trajetória nacional, ainda fazendo-se presentes enormes desafios. De acordo com os dados do CAGED/MTE, nos últimos 12 meses, o crescimento do emprego formal no estado do Rio de Janeiro, para o total das atividades econômicas, foi de 6,48%, contra um crescimento no total do país de 6,27%. (tabela anexa).

Mesmo na construção civil, que cresce fortemente em todo país, não se verifica nenhum privilégio para o ERJ. Nos últimos 12 meses, o crescimento do emprego formal na construção civil, no ERJ, foi de 10,40%, contra um crescimento no Brasil de 9,13%. (tabela anexa).

Do ponto de vista tributário, o ERJ também não apresenta nenhum privilégio. Comparando a carga tributária das unidades federativas, vê-se que o ERJ encontra-se apenas na 22ª posição, entre todas as unidades federativas, ficando atrás, por exemplo, de Minas Gerais (aqui foi usada a média do período 2006/2008, o que na verdade, atua contra o Rio, pois é um período com o preço médio do petróleo mais alto do que no período posterior) (gráfico anexo).

Essa carga tributária, baixa no cenário federativo, tem a ver com o fato de o ERJ pouco se beneficiar do Fundo de Participação dos Estados.

Além disso, é importante lembrar que o ERJ não recebe ICMS sobre a extração do petróleo, o que, na Constituição, teve uma excepcionalidade, sendo cobrado apenas no destino.

Ora, a extração de petróleo na Bacia de Campos, por um lado, infla o PIB fluminense, fazendo com que caia a nossa participação no FPE. Por outro, não recebemos nenhum imposto por essa extração. Se, além disso, os royalties passarem a ser distribuídos também tendo o FPE como critério, será injusto e totalmente irracional.

Além disso, como já afirmado antes, as perdas geradas a partir da transferência da Capital para Brasília ainda deixam importantes desafios.

A Região Metropolitana do Rio de Janeiro, apesar da dinamização do emprego, ocorrida em período recente, e de ter apresentado, entre 2003 e 2010 (série mais longa com a mesma metodologia, da Pesquisa Mensal do Emprego do IBGE), um crescimento do rendimento do trabalho superior às principais metrópoles brasileiras – pela chegada, principalmente, de estrangeiros, atraídos pelas possibilidades do setor petróleo –, ainda apresenta uma significativa taxa de desemprego para jovens.

Além disso, dados do IBGE e pesquisa de campo recente realizada em favelas cariocas, pelo IETS (Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade), mostram que a Região Metropolitana do Rio de Janeiro e mesmo a cidade do Rio, no quadro das principais metrópoles brasileiras, apresentam um número particularmente alto de jovens entre 18 e 24 anos de idade que não trabalham nem procuram emprego nem estudam, passando o dia à toa, de bermuda e sem camisa, com enorme descrença, sem perspectiva de vida, correndo o risco de serem atraídos pelo tráfico ou outras atividades ilícitas.

Na mesma direção, temos uma periferia da RMRJ que em boa medida ainda é dormitório, sendo que, em 2010, em torno de 75% do emprego formal do total da metrópole estava localizado apenas na cidade do Rio de Janeiro. Isso agrava, por exemplo, o problema de transporte de massas na RMRJ – minorado, do ponto de vista do custo para trabalhadores e empregadores, com o Bilhete Único recentemente implantado pelo Governo do Estado – e faz com que, de acordo com dados da última PNAD, o tempo de transporte diário gasto pelos cidadãos da metrópole carioca seja superior ao da metrópole paulista.

Do ponto de vista do saneamento, a periferia da Região Metropolitana do Rio de Janeiro apresenta apenas em torno de 5% das moradias atendidas com esgoto tratado. Além disso, a RMRJ e outras regiões do estado ainda apresentam problemas do ponto de vista de disponibilidade de água e telecomunicações.

O quadro acima traçado, sem nenhum exagero, mostra as possibilidades, os desafios e a responsabilidade do estado do Rio de Janeiro, no cenário de investimentos que chegam ao estado e dos mega eventos.

Para o Rio de Janeiro consolidar a reversão da trajetória das últimas décadas e gerar emprego e renda, será necessária a realização de um conjunto de investimentos.

Do ponto de vista econômico, não basta atrair grandes investimentos, como a Rio Polímeros, a CSA e o COMPERJ. É necessária a organização de uma política de complexos produtivos, atraindo micro, pequenas e médias empresas, além, por exemplo, de centros de pesquisa.

A grande empresa pode negociar individualmente, no momento do investimento, com o poder público ou ela mesma realizar os investimentos em infraestrutura que ela necessite. Micro e pequenas empresas, no entanto, precisam encontrar uma infraestrutura pronta, o que ainda não é o caso, em significativa medida, na RMRJ e em outras regiões do estado.

Ou seja, o Rio de Janeiro, ao contrário do que alguns pensam, não está nadando em dinheiro e, além disso, possui importantes passivos.

Deve-se ressaltar, portanto, que, por um lado não é racional a visão e propostas de alguns com relação à distribuição dos royalties. Isso, primeiramente, porque em todo mundo as regiões produtoras recebem royalties como compensação pelos problemas criados e por ser um recurso finito e, também, porque o Rio de Janeiro não possui uma carga tributária alta no cenário federativo e nem nenhum tipo de privilégio com o formato até hoje existente da distribuição de receita pública obtida no país.

Por último, deve-se lembrar que, muitas vezes são apontados “privilégios” de municípios fluminenses. É importante, dessa forma, demonstrar, com dados objetivos, que, ao contrário de um mito existente, pouquíssimos municípios fluminenses destacam-se em termos de royalties existentes e de receita pública para seus habitantes. Quando analisamos a situação dos 25 municípios da Região Sudeste mais beneficiados, em termo de receita pública municipal por habitante, encontramos, em 2009, apenas quatro do ERJ, contra sete de Minas Gerais e doze do Estado de São Paulo (tabela anexa).

Mesmo para esses municípios, que são exceções no estado, não é razoável, do ponto de vista social, realizar-se uma queda abrupta de receita, mas sim sendo preciso pensar em uma política de longo prazo de melhor distribuição interna, no estado do Rio de Janeiro, dos recursos públicos.

FONTE: CORECON- RJ

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