Os mercados de câmbio sofreram mudanças de tendências abruptas e volatilidade desde a deterioração do sentimento dos investidores em julho. Uma fuga para a segurança sustentou o dólar americano e forneceu ímpeto adicional para o iene japonês. O euro, que está no epicentro das preocupações do mercado, enfraqueceu, embora ainda não na medida em que se poderia esperar. A maioria das moedas dos mercados emergentes também caiu em graus variados e continua vulnerável a um recuo global muito mais acentuado do risco. Com o aumento das preocupações sobre a sobrevivência do euro, os mercados cambiais enfrentam novas turbulências nos próximos meses.
Enquanto a aversão ao risco se intensificou em reação às pressões financeiras soberanas e bancárias na Zona do Euro, e a preocupações sobre a desaceleração do crescimento global, os mercados de divisas geralmente seguiram um curso previsível. O dólar se recuperou de modo geral, sendo a única exceção contra o iene, e em uma média ponderada em meados de novembro estava cerca de 5% acima de seu patamar mínimo no final de julho.
Os fundamentos do dólar estão fracos: uma trinca de baixos rendimentos recordes, finanças públicas desordenadas e grandes necessidades de financiamento externo. Mas apesar desses negativos o dólar está se recuperando constantemente. Não obstante o recente fracasso de se aumentar o teto da dívida federal, os títulos do Tesouro americano não incluem um risco de crédito, ao contrário dos títulos soberanos dos países da Zona do Euro. E como o mais profundo e mais líquido mercado do mundo, os títulos do Tesouro continuam o lugar preferido para estacionar dinheiro em tempos de incerteza. Além disso, como o dólar tem sido a moeda de financiamento favorita para negócios de ativos arriscados, está sendo cotado mais alto conforme esses negócios se desenrolam.
Sem solução para crise na Zona do Euro à vista e com a provável persistência da incerteza sobre a previsão de crescimento global, a Economist Intelligence Unit espera que o dólar se valorize ainda mais nos próximos meses. Atualmente prevemos uma taxa de câmbio média de US$ 1,28 por euro em 2012, embora o dólar possa se valorizar muito mais se a crise na Zona do Euro não for contida (para não falar no risco de o euro deixar de existir totalmente).
Uma das poucas moedas que ainda não enfraqueceram contra o dólar desde julho é o iene. Sustentada pelo superávit de conta corrente do Japão e um forte balanço externo, o iene continuou se reforçando, enquanto a aversão ao risco levou os investidores japoneses a repatriar fundos investidos no exterior, ou pelo menos a conter novos investimentos externos. Os políticos japoneses intervieram nos mercados cambiais na tentativa de conter a força do iene, mais recentemente em outubro. Mas qualquer impacto sobre a taxa de câmbio durou pouco. A não ser que haja uma drástica reação política, como a decisão do Banco Nacional da Suíça no início de setembro de defender um teto para o franco suíço contra o euro, o iene provavelmente subirá ainda mais no clima atual.
Todos os olhos na Europa
O euro está no epicentro do atual mal-estar nos mercados financeiros globais. A moeda única se reforçou contra o dólar nos primeiros quatro meses do ano, atingindo o pico em US$ 1,48 no início de maio. Atualmente está sendo negociado a cerca de US$ 1,33, mais ou menos o mesmo nível em que começou o ano. No início de 2011 o euro ganhou apoio com a rígida posição anti-inflação do Banco Central Europeu (BCE), que levou a um aumento de 25 pontos básicos nas taxas de juros em abril e julho, levando a taxa básica a 1,5% (comparada com 0-0,25% nos EUA). O BCE reverteu um desses cortes no início de novembro e esperamos que o outro seja revertido em dezembro. Mas o impacto dos diferenciais de rendimento foi eclipsado desde a metade do ano pela escalada da crise da dívida. Enquanto a crise envolvia as grandes economias da Itália e Espanha (e hoje ameaça até a França e outros países centrais), a viabilidade da moeda única e sua própria sobrevivência estão sendo questionadas.
Diante disso, é surpreendente que o euro não tenha enfraquecido ainda mais, mesmo que — em contraste com os EUA — a Zona do Euro como um todo tenha uma conta corrente que está amplamente equilibrada. O declínio do euro contra o dólar foi muito mais acentuado nos primeiros cinco meses de 2010, quando as preocupações se concentravam quase unicamente na Grécia. Em meados de 2010 o euro caiu para um piso de US$ 1,19, antes que o primeiro socorro à Grécia revertesse a tendência de queda; o euro recuperou boa parte de suas perdas no restante do ano.
Por que o declínio do euro nos últimos meses foi menos agudo, já que as pressões financeiras sobre fundos soberanos e bancos são muito mais intensas? Talvez o fator mais importante tenha sido a repatriação de fundos por bancos da Zona do Euro, que têm vendido ativos estrangeiros para reforçar suas posições de capital e gerar caixa. Alguns estimam que a desalavancagem pelos bancos da Zona do Euro levará a uma redução de seus investimentos em ativos estrangeiros de até 2 trilhões de euros (US$ 2,7 trilhões). Além de apresentar o risco de um esmagamento do crédito global, este processo poderá criar volatilidade em algumas moedas de mercados emergentes de cotação frágil. O impacto sobre o euro dependerá da extensão em que os influxos na moeda única são compensados por vendas de ativos denominados em euro por estrangeiros ou, é claro, por residentes da Zona do Euro (isto é, fuga de capitais).
Diante das consequências calamitosas de uma ruptura da moeda única, nosso cenário central é que em última instância os políticos tomarão medidas para atenuar a falta de liquidez dos governos, mesmo que eles evitem as medidas estruturais para garantir a sobrevivência do euro em longo prazo. O caminho da menor resistência seria que o BCE usasse seu balanço para adquirir grandes quantidades de títulos italianos e espanhóis para estabilizar esses mercados, enquanto seus novos governos respectivos tomam medidas para convencer os investidores de sua solvência. Normalmente, seria de esperar que essa monetização da dívida do governo fosse negativa para a moeda, mas o resultado nas atuais circunstâncias seria incerto. Esse é o tipo de medida que os mercados estão forçando os políticos a adotar. O euro poderia muito bem subir com tal desenvolvimento político, apesar de preocupações sobre a degradação da moeda.
Temores dos mercados emergentes
As moedas flutuantes dos mercados emergentes foram atingidas de modo geral pela ressurgência da aversão ao risco em setembro. Os declínios foram muito acentuados, com muitas moedas perdendo mais de 10% de seu valor em relação ao dólar em poucas semanas. Alguns bancos centrais de mercados emergentes, incluindo os do Brasil e da Coreia do Sul, intervieram para atenuar a volatilidade. No entanto, de modo geral eles aprovaram uma desvalorização de suas moedas, diante de preocupações sobre excesso de valorização e perda de competitividade.
As moedas dos mercados emergentes recuperaram parte de seus prejuízos em outubro, mas caíram novamente em novembro enquanto a crise da Zona do Euro escalava. Algumas moedas foram atingidas pela desalavancagem dos bancos europeus ocidentais, que são a principal fonte de crédito interfronteiras para os mercados emergentes. Até que a aversão ao risco se acalme, esperamos que as moedas de mercados emergentes continuem sob pressão. Isto criará problemas em países com grandes necessidades de financiamento externo ou que têm grande quantidade de exposição desprotegida a moedas estrangeiras. A Hungria, que tem um grande estoque de hipotecas em francos suíços, já se candidatou à ajuda financeira precautória do FMI. A Turquia também poderá precisar pedir novamente ajuda ao FMI. A Turquia administra um grande déficit de conta corrente, e o setor corporativo tem exposição desprotegida a moedas estrangeiras.
Para muitos mercados emergentes, a situação é controlável por enquanto. O acesso ao financiamento estrangeiro se tornou mais caro e restrito, mas os mercados de capital permaneceram abertos para emprestadores dos mercados emergentes dignos de crédito. O governo brasileiro emitiu US$ 1 bilhão em títulos para 30 anos com rendimento de 4,7% no início de novembro, e o Banco do Brasil captou US$ 500 milhões em papéis de cinco anos a 4%. Isto em um momento em que — apesar do apoio do BCE através de seu programa de compra de títulos — os rendimentos de títulos do governo italiano para dez anos estão a cerca de 7% e os bancos periféricos da Zona do Euro dependem do BCE para liquidez. No entanto, as condições de mercado provavelmente se deteriorarão ainda mais nas próximas semanas, o que poderá deixar até os mutuários mais dignos de crédito dos mercados emergentes sem acesso aos mercados de capital. Isto criaria um risco de dificuldades de pagamento, assim como grandes e potencialmente perturbadoras desvalorizações.
O México e a Polônia se protegeram contra um arrocho prolongado dos mercados de capital fazendo arranjos de linhas de crédito flexíveis com o FMI. Outros países estão procurando se proteger com acordos de swap entre bancos centrais: em outubro a Coreia do Sul e a China duplicaram para o equivalente a US$ 57 bilhões seu atual acordo de swap cambial. Outros países podem ter de utilizar suas reservas. Os ativos em moeda estrangeira dos mercados emergentes estão em níveis recordes, e permitirão que os países reforcem suas moedas e adiem problemas de pagamento por algum tempo.
Mas no caso de um colapso do euro podem-se prever extremos deslocamentos de mercado, e as moedas dos mercados emergentes poderiam entrar em queda livre contra o dólar. Nesse caso, se apresentariam oportunidades de compra, assim como em médio e longo prazo é provável que se confirme a tendência dos mercados emergentes a experimentar valorização das moedas, diante da previsão de crescimento mais forte, sistemas financeiros mais sólidos e menores níveis de endividamento.
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