1.3.10

Risco de deflação preocupa os EUA

01 de março de 2010

Valor Economico (SP)

Rich Miller, Business Week

Os investidores aplaudiram as últimas notícias sobre a inflação nos Estados Unidos divulgadas em 19 de fevereiro. Apesar de um sensível aumento no custo da gasolina e de outros combustíveis, os preços ao consumidor subiram apenas 0,2% em janeiro. Talvez mais importante: o núcleo dos preços ao consumidor, que exclui os custos voláteis de alimentos e energia - e que é considerado indicativo da tendência da inflação -, caiu 0,1% durante o mês. A notícia acalmou o temor, no mercado financeiro, de que o Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA) será obrigado a elevar em breve os juros para manter a inflação sob controle.

É bom os investidores conterem seu entusiasmo. Apenas alguns meses após ter sido supostamente enterrada, analistas estão novamente começando a sussurrar a "palavra com D". "Recentes declarações de ´missão cumprida´ na luta contra os riscos de deflação agora parecem um pouco prematuras", diz Michael Feroli, economista do JPMorgan Chase.

Deflação, ainda que apenas seu vislumbre, é algo a ser temido, e não comemorado. Se vier uma redução generalizada de preços, isso poderá ser especialmente debilitante para a economia. Diante da perspectiva de diminuição dos preços de produtos, é improvável que as empresas expandam suas operações ou contratem trabalhadores. Preços em queda também dão ao consumidor já abalado mais um motivo para poupar seu dinheiro. Por que comprar algo hoje que amanhã custará menos?

Além disso, o presidente do Fed, Ben Bernanke, e seus colegas teriam extrema dificuldade para lidar com a deflação. Quanto mais caírem os preços, maiores ficarão os juros ajustados pela inflação, o que reduziria ainda mais a disposição das empresas e consumidores para tomar empréstimos e gastar. A última vez em que o núcleo do IPC mensal caiu foi em dezembro de 1982. A queda foi, à época, uma notícia boa: surgiu no final de um ano quando a inflação chegou a 6,2%, após ter atingido 10,3% em 1981. Em forte contraste, esse declínio de janeiro ocorreu quando a inflação já estava baixa. No geral, os preços ao consumidor caíram 0,4% no ano passado, em grande parte como resultado de queda nos custos de energia.

A queda em janeiro deixou o núcleo dos preços ao consumidor essencialmente inalterado, em comparação com seu nível em outubro. Nos últimos doze meses, eles aumentaram apenas 1,6%, bem abaixo da média dos dez últimos anos, de 2,2%.

Custos de moradia - principalmente despesas com aluguel ou com imóveis próprios - têm sido um fator importante no amortecimento da inflação. Isso não surpreende, porque essas despesas compõem cerca de um terço do índice de preços ao consumidor (IPC). Isso levou alguns analistas, como James Bianco, da Bianco Research, de Chicago, a argumentar que a inflação foi distorcida para baixo pelo estouro da bolha imobiliária e suas consequências.

É não são só os custos de habitação que estão caindo. Os preços de 44% dos produtos e serviços abrangidos pelo índice governamental de preços dos artigos de consumo pessoal (PCE, na sigla em inglês) - de computadores pessoais a tarifas de estacionamento -, caíram em dezembro (segundo dados mais recentes). Esse índice atribui peso menor aos custos de moradia do que o IPC e, por isso, é visto pelo Fed como uma medida mais exata da inflação no país.

O verdadeiro culpado por trás da tendência desinflacionária é a enorme quantidade de folga resultante na economia após a Grande Recessão. A indústria americana operou com apenas 72,6% de sua capacidade em janeiro, que cresceu a partir de um mínimo em 40 anos, de 68,3%, em junho, porém muito abaixo da média mensal de 81% desde 1967. Com todo esse excesso de capacidade ainda presente, as empresas não podem aumentar os preços sem risco de perder negócios para concorrentes.

Essa folga não vai desaparecer logo, mesmo com a economia em recuperação. Janet Yellen, presidente do Fed de São Francisco, diz que somente em 2013 a economia retornará a seu pleno potencial.

Mesmo assim, estão surgindo alguns sinais de pressões inflacionárias. Os preços de commodities e de bens importados estão em alta, impulsionados por um crescimento da demanda mundial, puxados pela China. Os custos das matérias-primas para as empresas americanas deram um salto de 9,6% em janeiro, o maior em três anos. Mas os salários, que com pensões e outros benefícios compõem dois terços do custo empresarial, continuam contidos, pressionados pelo elevadíssimo desemprego. As despesas com pessoal cresceram a uma taxa anual de 1,5% no quarto trimestre. Essa não é uma receita de recuperação robusta. Os ingredientes para um mix deflacionário ainda estão sobre a mesa.

(Copyright© 2010 The McGraw-Hill Companies Inc.)

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