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Especialistas veem a possibilidade de taxação múltipla, repasse dos custos para clientes e migração de negócios para outras praças
Daniela Milanese, correspondente da Agência Estado
LONDRES - O imposto definido por governos da Europa vai mexer com as atividades dos bancos estrangeiros. Enquanto os países buscam compensação pelas grandes quantias usadas para salvar instituições financeiras, especialistas veem a possibilidade de taxação múltipla, repasse dos custos para clientes e migração de negócios para outras praças.
Assim como os Estados Unidos, países como Reino Unido, Alemanha e França decidiram taxar os bancos, cada um a sua maneira, seguindo recomendação do Fundo Monetário Internacional (FMI), que preparou relatório sobre o tema a pedido do G-20. O objetivo dos três países europeus é "fazer o setor financeiro pagar uma fatia apropriada e substancial dos gastos dos governos para salvar o sistema bancário", após a turbulência que levou à crise global.
O FMI sugeriu a criação de dois tipos de taxas: uma contribuição para estabilidade financeira, baseada nos balanços patrimoniais, e outra sobre as atividades financeiras, sobre os lucros e a remuneração.
Até agora, os países têm optado por taxar o balanço patrimonial das instituições. O Reino Unido está com o trabalho mais adiantado, pois a proposta já foi incluída no orçamento de emergência divulgado pelo novo governo no mês passado e passará por análise durante o verão (no hemisfério norte).
A intenção é encorajar a redução do risco no sistema. "O governo acredita que os bancos devem fazer uma contribuição justa em relação ao risco potencial que impõem ao sistema financeiro do Reino Unido", conforme o texto do orçamento.
A taxa britânica vai valer a partir de janeiro de 2011, com o porcentual de 0,04% sobre os passivos consolidado dos bancos, descontados alguns itens, como o capital de nível 1 (tier 1) e depósitos do varejo. Depois de um ano, a cobrança sobe para 0,07%. O governo estima que vai arrecadar 2 bilhões de libras (US$ 3 bilhões) por ano com a taxação, recursos que entrarão como receitas.
A França e a Alemanha, que ainda não anunciaram detalhes, sinalizaram que usarão o dinheiro para a criação de um fundo destinado a ajudar o sistema em caso de novas crises. É um ponto que gera discussões, pois levanta a possibilidade de estímulo da tomada de risco, já que as instituições terão a garantia de que serão socorridas, caso necessitem.
"Os bancos poderão falhar sabendo que terão um fundo para sustentá-los", avalia Ivo Pezzuto, professor da Swiss Management Center University. Para ele, os governos deveriam apertar a regulação a fim de evitar a criação das condições perigosas que possam gerar outras crises. A falta de regras, lembra, levou as instituições a tomarem muito risco com pouco capital, espalhando o problema para os mercados financeiros e investidores, por meio da securitização.
Os europeus tentaram um acordo no âmbito do G-20 para a criação de um imposto global sobre os bancos. No entanto, não houve acerto sobre o tema, que encontrou resistência dos países que não tiveram problemas no setor financeiro, como Brasil e Canadá.
O sócio de tributação financeira da PricewaterhouseCoopers em Londres, Peter Maybrey, acredita que pode haver migração de negócios para outras praças com regras tributárias mais favoráveis.
Outra polêmica levantada no exterior é a possibilidade de taxação múltipla. Os bancos terão de pagar a taxa sobre o passivo consolidado no Reino Unido, incluindo, portanto, as atividades em outros países que também estão criando impostos. Especialistas acreditam que esse é um dos pontos que ainda precisam ser esclarecidos.
Pezzuto, da Swiss Management Center University, avalia que precisará haver coordenação entre os países da Europa para evitar o problema. Na análise da KPMG, não está claro se as instituições receberão isenção sobre cobranças similares estabelecidas por diferentes países. "Se os Estados Unidos, a França e a Alemanha também introduzirem um imposto, há um óbvio escopo para duplicação", analisa Rod Roman, sócio de tributação financeira da Ernst & Young.
Também existe discussão sobre como os bancos buscarão compensar o novo imposto e outros custos com a pressão para reforçar a base de capital, como as conversar para o acordo de Basileia 3. Para a KPMG, os custos devem ser repassados por meio de juros mais elevados e outras tarifas. "Todos esses custos terão de ser assumidos pelos acionistas, funcionários e clientes", avalia a Deloitte.
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