O
presidente do Banco Central, Alexandre Tombini. Sua gestão é marcada
pela recente tendência de queda dos juros.
Em 10 de outubro, o Banco Central do Brasil cortou sua taxa
de juro básica pela décima vez em pouco mais de um ano, para 7,25%. A
medida surpreendeu os analistas, pois os juros já estavam historicamente
baixos e a inflação, acima do centro da meta do Comitê de Política
Monetária, de 2,5-6,5%. Nem o crescimento econômico anêmico, que
provavelmente terminará este ano em 1,5%, nem a moeda, que tende a subir
com os juros enquanto se acumulam os investidores estrangeiros em busca
de retornos, supostamente influirão em suas deliberações. Mas hoje a
maioria dos analistas acredita que suas decisões são tomadas com vistas a
aumentar o crescimento e enfraquecer a moeda, e que a menos que a
inflação ameace romper a barreira dos 6,5% os juros continuarão baixos
por algum tempo.
Por enquanto, a demanda global contida significa que é improvável que
a inflação escape da coleira. Mas em longo prazo o governo terá de
conter os gastos públicos e aplicar reformas difíceis se quiser que o
Brasil cresça mais que 3 a 4% ao ano sem alimentar a inflação. Medidas
recentes para cortar os impostos em folha de pagamento, limitar os
aumentos de salários do setor público, reduzir os custos da energia e
melhorar a péssima infraestrutura de transportes deverão ajudar a
aumentar esses limites de velocidade econômica claramente modestos. Elas
também convenceram muitos de que a presidente Dilma Rousseff fará o que
for necessário para evitar que o banco tenha de aumentar de novo.
Taxas de juros permanentemente mais baixas seriam o mais positivo
avanço econômico no Brasil desde que a hiperinflação foi dominada quase
20 anos atrás, diz Enestor dos Santos do BBVA, um banco espanhol ativo
na região. As firmas investiriam mais — e ter um retorno decente
significaria financiar projetos produtivos, não apenas estacionar
dinheiro em títulos do governo.
Retornos ao credor
Mas em alguns setores os lucros estão caindo. Quando os investidores
perceberam que as firmas de eletricidade teriam de aceitar retornos
muito mais baixos a partir do início do próximo ano, ou ficar
inelegíveis para se candidatar a concessões que terminam entre 2015 e
2017, os preços das ações despencaram. Masha Gordon, da administradora
de fundos PIMCO, elogia o governo por tapar os ouvidos para interesses
escusos e declarar o fim do “almoço grátis” no Brasil. As
concessionárias de pedágios rodoviários e de energia que assinaram
acordos quando os juros estavam muito mais altos se beneficiaram
enormemente quando eles caíram, ela indica, deixando alguns projetos de
baixo risco com retornos reais próximos de 20%. Dificilmente se poderia
esperar que isso durasse.
Mas são os bancos que terão de se esforçar para se adaptar ao novo
ambiente de juros baixos no Brasil, diz Gordon. Suas margens líquidas de
juros vêm caindo há anos enquanto as taxas que cobram sobre empréstimos
caem juntamente com a taxa básica, e o espaço para cortar os juros que
eles oferecem sobre reduções de depósitos. Isso comeu os retornos. A
pressão sobre os lucros aumentou recentemente enquanto o governo
pressionou os bancos a transferir para os clientes os juros menores.
Os dois grandes bancos controlados pelo Estado, Caixa Econômica
Federal e Banco do Brasil, cortaram os juros a pedido do governo. Os
bancos privados tiveram de acompanhá-los ou perderiam participação de
mercado. Segundo a Anefac, uma organização de contabilistas, a taxa
média paga pelos mutuários brasileiros no varejo em setembro caiu abaixo
de 100% pela primeira vez. As taxas para empréstimos empresariais
também estão no menor nível histórico — 48% ao ano.
Pelos padrões brasileiros, esses juros podem ser baixos; pelos
internacionais, dão água na boca. O maior motivo, segundo Sergio Furio
da bankFacil, uma startup que oferece informações online sobre finanças
ao consumidor, é a ineficácia dos bancos brasileiros. Embora suas
receitas por funcionário estejam amplamente de acordo com outras grandes
economias, sua baixa produtividade é mascarada por preços muito altos.
Elas precisam de duas vezes mais pessoal para gerar os mesmos volumes
que os bancos da Europa ou dos EUA, ele indica — mas ainda são rentáveis
porque as margens também são duas ou três vezes maiores.
“Os bancos brasileiros vêm contando com o último sopro das taxas de
juros escandalosas”, diz Furio. Em vez disso, eles deveriam tentar ser
mais eficientes e atrair um tipo melhor de clientes. Os empréstimos de
alto custo afastam as pessoas abastadas que poderiam ser confiáveis para
repagá-los. Essa seleção adversa significa que as taxas de juros devem
ser aumentadas ainda mais para cobrir as frequentes inadimplências. O
bankFacil espera ganhar dinheiro rompendo esse ciclo, enviando usuários
recém-educados e dignos de crédito para instituições financeiras que
podem cobrar menos deles.
As mais altas taxas de juros estão nos cartões de crédito, que no
Brasil são principalmente usados para comprar produtos em prestações
“sem juros”. Os comerciantes oferecem planos de pagamento
autofinanciados de até 18 meses. Eles escondem seus custos financeiros
no preço da etiqueta e só recebem pagamentos mensais da emissora do
cartão do cliente. Os bancos ganham pouco com esse peculiar “crédito
sobre crédito”, que forma 70% do total dos empréstimos em cartão de
crédito no Brasil. Somente quando um detentor de cartão perde um
pagamento a emissora finalmente pode cobrar juros. Mas a probabilidade
de inadimplência entre esses pagadores é de 28%, o que significa que os
juros têm de ser astronômicos para que os bancos tenham algum lucro.
No mês passado o Itaú Unibanco, maior banco brasileiro de controle
privado, informou que gostaria de pôr fim ao uso dos cartões de créditos
dessa maneira. Mas o governo teme que os consumidores brasileiros
estejam tão habituados a pagar por tudo, de roupas a eletrodomésticos ou
carros, em prestações supostamente sem juros que poderiam parar de
gastar totalmente, cortando na origem uma nascente recuperação. Qualquer
medida terá de ser gradual.
A boa notícia é que os bancos brasileiros têm muita gordura para
cortar antes de chegarem ao osso. Eles também adquiriram muitos novos
clientes na última década, diz Franklin Santarelli da Fitch Ratings, um
processo caro que deverá dar recompensas durante a próxima. O Brasil
está “apenas entrando na corrente dominante”, diz Ceres Lisboa da
Moody’s, outra agência de classificação. Seus bancos, como os de outros
lugares, precisam descobrir como ganhar dinheiro com margens menores e
volumes maiores.
Fonte> http://www.cartacapital.com.br/economia/fim-do-almoco-gratis-no-brasil/