Conjuntura: Em ano eleitoral, baixo investimento e pressão inflacionária lideram lista de riscos do país
Chico Santos e Rafael Rosas, do Rio
O otimismo quanto à permanência de ventos favoráveis sobre a economia brasileira neste ano eleitoral e nos próximos dominou a mesa de debates do seminário "Cenários da Economia Brasileira e Mundial em 2010", organizado pela Fundação Getulio Vargas (FGV) com o apoio da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) e do Valor.
Alexandre Schwartsman, economista-chefe do banco Santander, vê um "o cenário muito favorável", mas alerta para o risco de o país seguir crescendo a taxas muito altas (7% ao ano nos últimos trimestres de 2009) para sua capacidade de suprir a demanda sem desequilíbrio inflacionário. Para ele, "o mais razoável é na casa de 4,5%".
"A ideia é tentar moderar o crescimento da demanda para colocá-la em linha com alguma coisa que seja sustentável ao longo de muito tempo, e não muito forte ao longo de pouco tempo", ponderou Schwartsman. Aos jornalistas, disse que, alinhado com a mesma preocupação, o Banco Central (BC) deverá elevar a taxa de juros básica (Selic) em pelo menos 0,5 ponto percentual em abril, podendo a Selic chegar ao final deste ano em 11,75% (está hoje em 8,75%).
Apesar da preocupação com o ritmo do crescimento, o economista do Santander disse que os indicadores de aumento do uso da capacidade instalada da indústria têm sido acompanhados pela elevação dos investimentos. Para Schwartsman, a economia não está tão sobreaquecida quanto esteve em 2008, mas a folga acumulada com a crise de 2009 "já acabou ou acaba ao longo de 2010".
Ele disse ainda que a recuperação econômica da América Latina está levando a que os produtos manufaturados voltem a liderar o crescimento das exportações brasileiras. Schwartsman destacou que a América Latina representa só 20% das vendas do Brasil, mas responde por 40% das exportações de manufaturas.
O economista Marcelo Neri, especialista em políticas sociais da FGV, após mostrar dados apontando uma redução do percentual de pobres no Brasil de 34,96% em 1992 para 16,02% em 2008, com aceleração maior a partir de 2003, disse que do ponto de vista dos indicadores de pobreza a crise terminou há muito tempo, tanto que quando são computados os dados dos 12 meses terminados em fevereiro deste ano os indicadores já são favoráveis . "Os resultados continuarão a ser colhidos nos próximos cinco anos", afirmou Neri.
Ele destacou o crescimento da chamada "nova classe média" - a "classe C" - e disse que a redução da pobreza deu-se não apenas por conta dos programas sociais, como o Bolsa Família, e dos benefícios previdenciários, mas, principalmente, pelo aumento da renda do trabalho. "A redução (da desigualdade) foi dois terços pelo trabalho e um terço pela Previdência e o Bolsa Família", afirmou.
O economista Flavio Castelo Branco, diretor da Unidade de Política Econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), apresentou um cenário mais cauteloso, apesar de reconhecer avanços. Após alertar para os desequilíbrios estruturais ainda não atacados por estarem "congelados pelo crescimento econômico", Castelo Branco disse que é preciso elevar a taxa de poupança doméstica para dar sustentação ao aumento da taxa de investimentos. "Não sei se para 25% ou 22%. Mas não pode ficar nos atuais 18% (do PIB)", disse.
Ressalvas à parte, nem o processo de sucessão presidencial deste ano assusta os participantes do seminário. O diretor de Política Monetária do BC, Aldo Luiz Mendes, disse que "quem define o câmbio é o mercado" e que ele não vê "nenhuma alteração que possa vir da questão política". Mendes procurou demonstrar na sua palestra que hoje a taxa de câmbio presente do Brasil não é afetada pelos fluxos diários de moeda estrangeira (dólares americanos), mas pela percepção de risco global e pela expectativa de fluxo futuro.
O cientista político Amaury de Souza, sócio-diretor da empresa Techne Informática, disse que espera "programas muito similares" na área econômica e que "ninguém vai ser muito ousado". Em tom de brincadeira, o moderador do evento, economista Carlos Langoni (FGV), disse que a certeza de que os principais alicerces da política econômica não serão alterados em caso de vitória da ministra Dilma Rousseff é tamanha que este ano quem teria que apresentar uma Carta aos Brasileiros seria o PSDB, do candidato José Serra.
Carta aos Brasileiros foi um compromisso com a política macroeconômica do governo anterior divulgado pelo PT durante a campanha de 2002 para acalmar o mercado que temia a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva.