29.10.09

Fique sabendo!


Um olhar - preocupado - para 2010

Valor Economico (SP)
Luiz Carlos Mendonça de Barros


Os sinais de recuperação da atividade econômica global são cada vez mais claros. Mas uma análise cuidadosa revela uma grande dispersão na forma como essa volta à normalidade está ocorrendo. Algumas economias - como a brasileira e a australiana - já operam com uma dinâmica sustentável e alguns indicadores voltaram aos níveis verificados em setembro do ano passado. É o caso da taxa de desemprego e do número de pessoas empregadas na pesquisa do IBGE no Brasil. A característica comum dessas economias é a pequena dependência das exportações de produtos industriais como polo dinâmico do crescimento. Elas dependem muito pouco da demanda dos consumidores nos países mais ricos, que continua deprimida.

Outro grupo de países tem vivido uma recuperação rápida, puxada pela volta do crescimento acelerado na China. É o caso dos países asiáticos que vivem uma verdadeira explosão da atividade industrial em função da retomada de suas exportações. Exemplos mais importantes desse grupo são a Coreia, Cingapura e Taiwan. A Rússia é outra economia que pode voltar a crescer nos próximos meses, embora as causas sejam diferentes das que afetam os países asiáticos. Altamente dependente da venda de produtos ligados ao petróleo, a recuperação dos preços é a base para a volta à normalidade. No grupo que engloba os países desenvolvidos, os sinais de uma recuperação sólida e sustentável são ainda incipientes. O processo será mais tortuoso e o risco de surpresas negativas ainda é alto nos próximos meses.

Mas, a consolidação da recuperação do mundo em 2010 depende principalmente do que ocorrerá nas duas principais economias do mundo. Portanto, é para os EUA e para a China que volto minha atenção neste nosso encontro mensal.

No caso americano o cenário para 2010 ainda está em aberto. De um lado estão os adeptos do chamado "new normal", para quem o alto endividamento do consumidor será um obstáculo praticamente insuperável para uma recuperação rápida e consistente. Para esses, a montanha de dívida - inclusive a do governo - continuará estrangulando a economia e dificilmente o crescimento será superior a 2% ao ano. Isso significa que o desemprego permanecerá alto ainda em 2010 e mesmo em 2011. Nesse cenário a fragilidade das contas públicas dificultará a adoção de novos estímulos fiscais, de modo que o risco de recaída recessiva ainda é bastante alto.

Mas, outro grupo de analistas, entre os quais me incluo cada vez mais, já considera a possibilidade de um cenário mais positivo. Para estes, é possível que o crescimento econômico seja superior a 3% - talvez até 4% - nos próximos dois anos. A estabilização das condições financeiras a partir da épica intervenção estatal nos mercados, o rápido ajuste das empresas que já acumulam recursos e reduzem seu endividamento em velocidade inédita, a manutenção já contratada de forte expansão fiscal em 2010 e, especialmente, o ciclo de estoques nos próximos trimestres, são as razões para tal desempenho. Para qualificar esse número vale dizer que, dada a queda do PIB durante os meses críticos da crise, o padrão histórico das recuperações cíclicas da maior economia do mundo apontaria para um crescimento em 2010 da ordem de 6 a 7%.

Mas, mesmo esse cenário mais otimista não é isento de problemas. O principal risco é o tão temido processo de remoção por parte do Fed da liquidez que hoje inunda o mercado financeiro.
Afinal são US$ 2 trilhões que precisarão ser recolhidos em algum momento no próximo ano. Uma bobeada da autoridade monetária americana pode se tornar uma ameaça à estabilidade financeira e abortar essa recuperação mais forte da economia.

Sabemos que o dinheiro a custo zero nos EUA é uma das razões para o desempenho excepcional de todos os ativos de risco neste ano, incluindo a valorização das moedas dos países emergentes. Enquanto essa situação perdurar, em um contexto de recuperação econômica global e inflação baixa, mais subirão os preços desses ativos. Em certa medida, a euforia atual - bolha? - guarda uma estranha semelhança com as práticas que nos levaram à crise. Quanto mais longe for esse processo, maior será o risco de brusca reversão quando o Fed e outros bancos centrais iniciarem o aperto.

Já no caso da China é preciso fugir do brilhantismo dos números dos últimos seis meses para se ter uma real dimensão do que pode representar a economia chinesa para a recuperação definitiva da atividade econômica mundial. É evidente que a inserção da China na economia mundial precisa mudar de configuração. Os vetores domésticos, em especial o consumo privado e os investimentos em serviços e bem estar social, devem liderar o crescimento nos próximos anos. Há sinais que a demanda interna chinesa de fato esteja se tornando mais dinâmica, mas esse é um processo que está apenas no seu início. Os gastos do governo precisarão ser substituídos por demanda privada ao longo do próximo ano para perenizar seu crescimento atual. Não tenho dúvida que ele será bem sucedido no médio prazo, mas, nesse meio tempo, os riscos ainda são elevados.

Além disso, há o elemento externo. A resistência da China em aceitar uma valorização cambial é a principal manifestação exterior de sua insegurança. Mas o fato é que hoje a China não pode mais operar como se fosse uma pequena economia aberta, isto é, uma economia cujas escolhas não afetam o resto do mundo. Ao contrário, a manutenção do câmbio desvalorizado e de superávits em conta corrente representa um elemento deflacionista para outros países, que precisam de maior demanda vinda dos países credores como o gigante chinês. Como o principal país credor, a China sofrerá pressões crescentes para mudar seu regime cambial e essa também é uma fonte de tensão no tecido econômico global.

Para o Brasil, a forma como se der essa transição, terá influência decisiva. Sabemos que o dinamismo de nossa economia deve-se em grande parte a fatores internos, mas um cenário instável na China e no mundo mais rico vai nos afetar de forma importante. É preciso estar atento e deixar a euforia irresponsável para mais tarde.

Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é diretor estrategista da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações.

As consequências econômicas do pré-sal

Valor Econômico
Sergio Vale
Em 2020, consumo interno de petróleo não vai permitir excedente para exportação

A Petrobras está trabalhando com estimativas que podem não levar a excedente exportável nos próximos dez anos

Depois de dois anos do anúncio das descobertas de petróleo do pré-sal, o governo apresentou sua proposta de modelagem para a exploração das novas reservas. Não entraremos aqui no mérito do modelo, marcos legais, questões relativas a royalties etc.. Vamos nos concentrar em um ponto que não tem sido discutido e que trata dos impactos econômicos do pré-sal.

A primeira questão é que não se sabe exatamente ainda qual será a produção do pré-sal. As projeções do plano de investimento da Petrobras consideram que a produção de petróleo deverá dobrar até 2020. Dos estimados 2 milhões de barris deste ano, a produção alcançaria 3,9 milhões em 2020, sendo que a maior contribuição adicional seria da bacia do pré-sal. Ou seja, dobraremos a produção em 10 anos. Parece muito, mas na verdade pode não ser.

A diferença é que as perspectivas de crescimento da economia brasileira hoje são muito diferentes do que eram nos anos 80, quando a produção da Bacia de Campos começou. Agora, a perspectiva é de crescimento forte nos próximos anos. Com isso, a expansão da produção pode ser suficiente apenas para a demanda doméstica.

Apenas em dois momentos tivemos "sobra" de produção. Primeiro, na década de 50, quando a produção começou e ainda se buscavam usos para o produto. O segundo, na década de 80, porque a Bacia de Campos entrou em funcionamento durante uma crise econômica. Só nessas ocasiões a produção superou a demanda.

Utilizando métodos econométricos, estimamos uma elasticidade na produção de petróleo-PIB média de 1,6 no Brasil. Ou seja, para cada aumento de 1% no PIB brasileiro, a produção de petróleo deveria aumentar cerca de 1,6%, isso descontados os períodos de exceção das décadas de 50 e 80. Considerando um PIB médio de 4,5% de crescimento ao ano até 2020 (lembrando que entre 2004 e 2008 a média foi de 4,7%), a produção de petróleo necessária para atender a demanda em 2020 seria de 3,9 milhões de barris/dia.

Ou seja, a Petrobras está trabalhando com estimativas que podem não levar a excedente exportável nos próximos dez anos. Não custa lembrar que nos últimos dez anos a produção de petróleo também dobrou, mas a média de crescimento foi de apenas 3%, e não há excedente exportável ainda hoje. A Petrobras trabalha com um consumo doméstico de 3 milhões em 2020, o que nos parece muito baixo. E fala de 5,7 milhões de barris de produção daqui a dez anos, sendo 600 mil barris de produção fora do país e 1,1 milhão de barris equivalentes de gás, que supostamente poderiam substituir parte da importação da Bolívia. Assim, nas nossas contas, continua não sobrando petróleo para exportação.

O fundamental para essa diferença em relação ao passado é que o país tem perspectiva de forte crescimento nos próximos anos, o que pode jogar um pouco de água fria na rapidez que se coloca nessa capacidade exportadora do pré-sal. Valendo a elasticidade de 1,6 até 2030 a necessidade doméstica de petróleo subiria para 7,2 milhões de barris/dia, o que deve ser coberto pelo pré-sal, mas joga dúvidas ainda na capacidade de exportar o produto a longo prazo.

Uma segunda questão que se coloca é a quantidade de investimentos para os próximos anos. Em toda sua história, a Petrobras investiu US$ 174 bilhões. Nos próximos cinco anos se propõe investir a mesma quantidade. São 50 anos em cinco de investimento. Se de fato a perspectiva de produção não parece ser tão forte assim, fazer investimentos dessa magnitude pode trazer prejuízos à rentabilidade da empresa.

Além disso, um terceiro ponto coloca a questão do impacto dos investimentos nas importações. Há uma certa "obrigatoriedade" de que 65% de todo o investimento feito seja em máquinas e equipamentos domésticos. No novo modelo, a Petrobras será ainda mais monopsonista. Mesmo sendo empresa de capital aberto, existem riscos de favorecimento de preços maiores de insumos e máquinas e equipamentos quando se compara com um monopsônio privado. Isso pode levar a desvio de produção. Num momento de crescimento da economia pode haver pressão nas importações de máquinas e equipamentos diretamente, para o próprio setor, e indiretamente, por desvio de produção.

Por fim, um quarto ponto relaciona-se à eficiência energética, à questão ambiental e a combustíveis substitutos. No caso da eficiência, ela aconteceu em países com aperto de fornecimento de energia, como a Europa das duas últimas décadas. Em país com abundância energética a partir de agora, é difícil imaginar a busca de caminhos por eficiência. No caso ambiental e de combustíveis substitutos um candidato natural seria o álcool e toda a cadeia alcoolquímica que pode surgir daí.

Não havendo interferência estatal no setor de cana, pode ser que no longo prazo a matriz energética passe a depender mais de álcool do que de petróleo. Isso porque se supõe que num horizonte longo de tempo empresas estatais tendem a ser menos eficientes que as privadas. A questão é a estratégia a ser usada: incentivaremos cada vez mais o álcool aqui dentro e viraremos exportadores de petróleo ou todas as atenções se viraram para a galinha fácil dos ovos de ouro que se tornou a Petrobras? Dado o histórico de planejamento energético ineficiente do país nos últimos 30 anos, o efeito do pré-sal poderá ser sujar ainda mais a matriz energética brasileira.

O que tudo isso quer dizer? Que, talvez, nem a explosão das importações nem das exportações possa acontecer nos próximos 10 anos. Talvez estejamos apenas aumentando uma oferta necessária para o consumo doméstico. Talvez toda a discussão sobre a maldição do petróleo e a doença holandesa esteja equivocada nos próximos 10 anos. Mas a única certeza que se tem é da maior presença estatal na produção de petróleo no Brasil. Sabendo de antemão que a eficiência estatal é, em geral, menor que a privada, o processo pode ser mais lento do que o desejado e pode se mostrar um retrocesso.

As consequências do pré-sal

Ultimo Segundo

Por Maria Angélica
Nassif,


Independente das discussões sobre o marco regulatório do Pré-sal e sobre quem vai lucrar ou não, considero que já existe um ganho: abre-se uma discussão sobre o mercado de trabalho e, em consequência, sobre o investimento que o Brasil terá que fazer no segmento educação. Preparar mão de obra especializada para o grande desafio tecnológico que será explorar essa riqueza.

Segue informação colhida no portal de comunicação da Petrobras:

Exploração do pré-sal necessitará da capacitação de 240 mil profissionais até 2016

Em debate, presidente Gabrielli falou sobre o novo marco regulatório do petróleo e os desafios tecnológicos para a exploração da camada pré-sal

O presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli de Azevedo, participou nesta sexta-feira (25/9) de debate promovido pelo Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Confea), em Brasília, sobre a proposta do novo marco regulatório do petróleo e os desafios tecnológicos para a exploração da camada pré-sal. Gabrielli disse que para produzir o petróleo da camada pré-sal será preciso desenvolver a indústria nacional e treinar mais de 240 mil profissionais até 2016. “Essas pessoas serão treinadas não para a Petrobras, mas para a cadeia de suprimentos que irá nos atender”.

De acordo com Gabrielli, o treinamento desses profissionais envolve instituições de ensino brasileiras, com 29 redes temáticas e mais de 500 pesquisadores. “Isso cria, fora da Petrobras, laboratórios de alto nível, capacitação de análise e interpretação e capacitação das áreas de ciência básica e aplicada tendo um impacto não somente sobre a Petrobras, mas também sobre a engenharia brasileira, sobre o desenvolvimento dos projetos e a pesquisa em geral do nosso país”.

Quase um assalto

Jornal Cruzeiro do Sul


O governo parece ter finalmente acordado para o nível escorchante de juros cobrado pelos bancos nos cartões de crédito. Terça-feira, o presidente Lula reclamou que os bancos se comportam quase como assaltantes nos juros do cheque especial e nos do cartão de crédito.
No cheque especial, são de 160% ao ano; e no cartão de crédito, de 240% ao ano. Apenas para comparar, o nível dos juros básicos, a Selic, que tantos analistas consideram despropositado, é de 8,75% ao ano.

Até agora, o Banco Central não se mostrou nem um pouco preocupado com o assunto. No caso dos cartões de crédito, está mais interessado em acabar com a verticalização dos serviços prestados pelas administradoras de cartões do que em acabar com esses juros aí - embora o perfil dessas empresas também tenha de ser atacado.

As administradoras dos cartões de crédito, ou seja, os bancos atrás delas, alegam que os juros têm de ser esses porque a inadimplência nesse segmento é alta demais, de 30%. Como esta coluna já comentou em sua edição de 23 de agosto, essa é uma desculpa esfarrapada. Para uma população que ainda não chegou a 200 milhões de habitantes, há hoje mais de 552 milhões de cartões (incluídos os de crédito, os de débito e os de loja).

Cartões de todas as bandeiras são empurrados para qualquer um. As administradoras assediam os candidatos a mais um cartão por telefone, por e-mail, por mala direta ou pelos gerentes das agências bancárias. Com juros tão elevados, a inadimplência tem mesmo de ser alta. Quem cai nessa vida não sai dela facilmente.

Tanto se fala em cadastro positivo, ou seja, em cobrança de juros diversificada conforme o perfil do cliente e, no entanto, os bancos relutam em adotar a novidade porque entendem que ganham mais sem esse instrumento. No cartão de crédito, a instituição de uma espécie de cadastro positivo seria ainda mais justificada.

As administradoras sabem com quem estão lidando. Detêm não só o perfil financeiro, como também o perfil de consumo do cliente. Poderiam perfeitamente trabalhar com juros diversificados, e a inadimplência talvez não fosse tão alta. Se não o fazem é, outra vez, porque entendem que ganham mais dinheiro assim.

Os cartões de crédito são um instrumento importante de racionalidade no sistema de pagamentos do País e de enorme redução de custos dos bancos. Graças à sua disseminação, o volume de moeda manual na economia pôde baixar consideravelmente, o que beneficia o governo. E os bancos não só puderam reduzir o movimento de seus caixas e os cuidados com o transporte de numerário, como puderam gradativamente dispensar o uso do cheque, de alto custo operacional. E, no entanto, em contraste com esse retorno tão substancial, os bancos mantêm em relação ao usuário do cartão um comportamento predatório.

O presidente Lula tem toda a razão de reclamar dos bancos. Como também tem razão de reclamar da passividade do usuário do cartão de crédito, que se sujeita a esse tratamento. Mas não pode fugir de suas responsabilidades. É o seu governo que nunca havia se importado com os quase assaltos.

Reflexões de um ex-vira-lata

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

A cotação do Brasil está muito alta; como economia, como ator na cena internacional, como nação culturalANTONIO PATRIOTA , até recentemente embaixador brasileiro aqui em Washington, reclamou comigo: "Para de falar em complexo de vira-lata! O Brasil passou dessa fase". Talvez o nosso embaixador tenha razão. O Brasil vem ganhando autoconfiança com uma rapidez surpreendente.

Nas recentes reuniões do G20, em Londres e Pittsburgh, e na última reunião anual do FMI, em Istambul, o Brasil bateu um bolão. Somos subdesenvolvidos? Sim. Temos equipes pequenas? Sim, muito menores do que as dos países desenvolvidos. E, no entanto, as delegações brasileiras têm sido das mais atuantes e -correndo o risco de soar presunçoso- acrescento: das mais influentes.A aliança Bric (Brasil, China, Índia e Rússia) vem sendo fundamental. Mas não é só isso. O Brasil, em si mesmo, tem tido um papel cada vez maior.

Há um fator que nos ajuda enormemente: a imagem favorável do país no exterior. A cotação do Brasil está muito alta. Do Brasil como economia, do Brasil como ator na cena internacional, do Brasil como nação cultural.Bem sei, leitor, que o brasileiro está longe de compartilhar uma visão tão positiva. Talvez porque esteja mais perto do Brasil e conheça melhor as nossas mazelas. Talvez porque o complexo de vira-lata ainda esteja mais vivo do que imagina o embaixador Patriota.Faço ainda outra ressalva: existe provavelmente um certo economicismo na forma como os países são vistos internacionalmente. O chamado mercado (um dos codinomes da turma da bufunfa) só se interessa pelos indicadores econômicos e financeiros. Não quer nem saber da péssima distribuição de renda, dos problemas sociais, dos níveis ainda elevados de pobreza e de miséria.Ora, os indicadores econômicos brasileiros têm ficado, em geral, acima do esperado. Até 2007-2008, os nossos detratores (quase sempre brasileiros) diziam: "O Brasil está navegando uma onda internacional favorável".Veio então a maior crise internacional desde a Grande Depressão. A torcida adversária (brasileira, em geral) começou a salivar intensamente, aguardando o colapso. Não aconteceu. O Brasil sofreu os efeitos da crise, claro. Mas menos do que se esperava. A recuperação brasileira também começou mais cedo do que o previsto. Basta dizer uma coisa: no meio dessa crise mundial, o Brasil anunciou um empréstimo de US$ 10 bilhões ao FMI.O meu complexo de vira-lata deu arrancos triunfais de cachorro atropelado (para combinar dois bordões do Nelson Rodrigues em uma única frase). Quis o destino ou o acaso que coubesse a mim, logo a mim - devedor nato, hereditário e até inadimplente -, ser o diretor-executivo pelo Brasil no Fundo exatamente nessa conjuntura. Qualquer um dos meus antecessores -Alexandre Kafka, Murilo Portugal ou Eduardo Loyo- desempenharia o papel de credor com mais categoria e convicção.Só tenho uma coisa a dizer em meu favor: apesar de credor neófito, acho que preservo uma identificação autêntica com os devedores do FMI. Sei o que significa ser devedor dessa instituição e, dentro do que posso, empresto a minha voz aos países em crise, especialmente os pequenos e oprimidos (mesmo aos brancos de olhos azuis). Foi o que tentei fazer pela Islândia, por exemplo, que passou ontem pela Diretoria-Executiva do FMI.Dizem que os mulatos podem ser os piores racistas. Que os cristãos-novos são os mais fervorosos. Que um credor neófito pode ser o mais linha-dura. Vamos tentar desmentir esses ditados.

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR. , 54, . É diretor-executivo no FMI, onde representa um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago), mas expressa seus pontos de vista em caráter pessoal.
FSP

28.10.09

O neoliberalismo foi destruído pela crise, diz Mantega; confira a entrevista exclusiva

Ultimo Segundo

Depois de detalhar para jornalistas os auspiciosos resultados do PIB no segundo trimestre do ano, na última sexta-feira (11), o ministro da Fazenda, Guido Mantega, falou com exclusividade para o Último Segundo, em São Paulo, sobre as consequências da crise econômico global, um ano depois da sua eclosão, com a quebra do lendário banco de investimento americano Lehman Brothers. A seguir, os principais trechos da conversa com o jornalista José Paulo Kupfer, colunista do iG.

O que a crise global ensinou ao Brasil?

Guido Mantega - Ensinou que vale a pena manter uma economia pouco endividada e pouco dependente, principalmente do sistema financeiro internacional. A primeira lição é que realmente é melhor entrar como credor do que como devedor. No passado, entrávamos nas crises como devedores e apanhamos muito por essa razão.

A segunda lição é que, se uma economia entrar numa crise com uma situação fiscal sólida, será muito mais fácil aplicar políticas anticíclicas sem comprometer as contas públicas. Não adianta fazer uma série de políticas de estímulo, mas, com isso, abrir um buraco fiscal, como aconteceu com outros países.

Mas essa não é uma receita para qualquer tempo, com crise ou sem?

A execução da receita não é trivial. Os EUA, por exemplo, entraram na crise com déficits em transação correntes e com desequilíbrio fiscal. Com a crise, eles tomaram uma série de medidas necessárias, mas depois terão de pagar uma conta enorme. A nossa conta é pequena, justamente porque entramos sólidos na crise. É bom, sim, entrar na crise com um crescimento forte. Quando entramos na crise, a economia brasileira vinha de um período longo de investimentos elevados e de crescimento maior. Nós entramos na crise com musculatura e, assim, mesmo perdendo um pouco de musculatura na fase aguda das turbulências, ainda foi possível sair forte e mais rápido.

"Quem entrou frágil na crise foi para o buraco"

Em relação ao pensamento econômico padrão, as vantagens da economia brasileira no enfrentamento da crise são, na verdade, defeitos. Nossa economia é mais fechada, nosso sistema bancário é pouco integrado ao sistema global, o sistema financeiro é mais simples, a situação fiscal é controlada, mas com gastos correntes em expansão. Nossos “defeitos” foram virtudes na hora da crise?

O que você está chamando de defeito é um setor financeiro mais conservador, menos alavancado. Significa que temos, no Brasil, uma regulação bancária mais forte do que lá fora, o que impede que se façam aqui as loucuras que foram feitas lá fora. Nesse campo, nosso verdadeiro defeito, melhor dizendo, uma anomalia, é o compulsório cobrado dos bancos sobre depósitos, muito mais elevado que no resto do mundo. Em geral, o compulsório nos outros países é de 6% , 8%, no máximo 10%. Aqui, o compulsório era de 58%. Esse, de fato, era um desvio, mas nós temos lastro para reduzi-lo. Enfim, foi um conservadorismo que acabou sendo positivo no momento.

Que reformas já foram feitas nas economias globais que possa dar garantias de que uma crise como essa só se repetirá daqui a 50 anos?

A reforma fundamental é a do sistema financeiro mundial. É preciso aumentar a regulação e fechar os canais que facilitem as loucuras do tipo das que foram feitas. Os países do G-20 estão fechados em torno da ideia de uma regulação financeira mais forte. Os EUA também apresentaram uma proposta positiva. Um ponto importante é a realização de “testes de estresse” periódicos nos bancos, com o objetivo de detectar alavancagem excessiva e exigir a devida e imediata capitalização.

Dá para apostar que essa reforma, quando vier, limitará a alavancagem dos bancos?

Vai limitar muito. Houve erros de governos, principalmente do governo americano, permitindo uma desregulamentação excessiva. A alavancagem dos bancos de investimento, por exemplo, era absurda. O Lehman Brothers estava alavancado em mais de 30 vezes. Ele emprestava US$ 30 bilhões com US$ 1 bilhão de capital. A exposição era absurda.

O sistema deve caminhar para enquadrar todas as instituições nos níveis de Basileia II [acordo ratificado por mais de 100 países, em 2004, fixando exigências mínimas de capital para operações de bancos comerciais], que define um limite de alavancagem de 11 vezes o capital da instituição. O Brasil, só para efeito de comparação, está com 6,5. Estamos seguros e podemos até aumentar a alavancagem sem nenhum risco.

Há um consenso internacional de que é preciso levar todo o sistema, inclusive os derivativos, para o limite de Basileia II. Além de impor os limites de Basiléia II, temos de fazer mais exigências de capital de acordo com o risco do negócio.

Finalmente, é preciso acabar com a farra dos bônus em dinheiro para executivos financeiros. Esse é um esquema que gera conflitos com a boa administração do negócio. Aos dirigentes dos bancos, por conta dos bônus, que lhes garantiam somas incríveis de dinheiro, interessava conceder financiamentos sem medir os riscos.

"Houve erros de governos, principalmente do governo americano"

Há dúvidas sobre a recuperação da economia mundial. Pode ser em V como o Senhor espera, mas tem quem fale em W, ou seja, acham que pode haver uma recaída. É evidente, dada a montanha de dinheiro injetada na economia, que a saída da crise, na economia global, não será sem dor. A economia brasileira pode sair sustentadamente da crise sem que a economia mundial também tenha saído sustentadamente da crise?

Acredito que a economia mundial está se recuperando, ainda que lentamente. Não acredito numa recaída, que configuraria uma curva em W. A curva em W se daria se os países desativassem as políticas de estímulo. Eu declarei exatamente isso no meu discurso no G-20, dias atrás.

Não é o momento de desativar os programas fiscais porque, aí sim, se forem desativados, pode haver uma recaída. Se os programas de estímulo não forem desativados, a economia mundial continuará em recuperação. Já são muitos os sinais de que isso está acontecendo e em economias como a dos EUA, Alemanha, França e no próprio Japão.

Se o pior da crise já passou, por que então continuar com os estímulos?

Ao contrário do Brasil, que teve uma queda menor e limitada no tempo, só dois trimestres, os países avançados tiveram quedas fortes em três ou quatro trimestres consecutivos – ou seja, já vinham mergulhando e foram para o fundo do poço. Estão agora saindo do fundo do poço, mas há um longo caminho até voltar à superfície. O pior já passou, mas para eles a crise ainda não acabou. No ano que vem, todo mundo vai estar no positivo, mas ainda abaixo em relação ao início da crise.

Em declarações recentes, o sr. acenou com a possibilidade de o Brasil chegar, dentro de algum tempo, ao grupo das cinco ou seis maiores economias do planeta. Será então uma das cinco ou seis maiores economias, mas com um dos maiores índices de pobreza e uma das cinco piores distribuições de renda do planeta?

Felizmente, estamos trilhando o caminho do desenvolvimento com distribuição de renda. O ciclo que tivemos de 2003 a 2008 se distingue de outros ciclos porque estamos conseguindo ao mesmo tempo fazer crescer a economia e aumentar a capacidade de consumo da população de baixa renda, tanto que a classe média brasileira está crescendo e já predomina.

Temos mobilidade social e, a partir do crescimento da economia e da geração de empregos, que será positiva também este ano, acrescidos dos programas sociais que o governo tem executado, a pobreza está diminuindo muito rapidamente no Brasil – e diminuindo também a desigualdade social.

O índice de Gini, que mede a desigualdade, está no seu menor patamar e ainda não temos o resultado de 2008 que, certamente, será melhor do que o de 2007. Nós seremos, repito, nos próximos 20 ou 30 anos, uma das cinco maiores do mundo e com uma situação social favorável.

É possível afirmar que os princípios neoliberais, hegemônicos nas economias mais maduras, foram derrubados pela crise?

Eu não tenho a menor dúvida de que o neoliberalismo em geral e o Consenso de Washington em particular foram destruídos por esta crise.

"Trinta anos de política neoliberal, de desregulamentação, foram por água abaixo"

A crise mostrou o desastre que pode ocorrer quando se deixa a economia à mercê de um sistema financeiro fazendo o que bem entende, com o Estado ausente, não cumprindo as funções de regulação, fiscalização e de estimulo à economia.

A receita que dá certo é a aplicada no Brasil: regulação mais forte e uma participação mais ativa do Estado, fazendo política social e garantindo estímulos ao mercado. O grande objetivo é garantir o crescimento. Quando há crescimento, a arrecadação melhora, os déficits diminuem. Forma-se um ambiente capaz de impulsionar o País para o futuro.

Mudança na lei obriga empresas a informar dados para contato em boletos

G1

Uma alteração feita no Código de Defesa do Consumidor, no início do mês, vai facilitar o contato dos consumidores com empresas fornecedoras de produtos e serviços.

A lei federal 12.039, deste ano, foi inclusa no artigo 42 do código e torna obrigatório, desde o dia 1º de outubro, que todos os boletos de cobrança apresentem o nome, endereço e o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas ou no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) do fornecedor do produto ou do serviço.

"Não havia determinação específica sobre isso para boletos”, diz Maria Inês Dolci, coordenadora institucional da Pro Teste, associação de defesa do consumidor. Com a determinação, as empresas estão sujeitas a visitas de órgãos fiscalizadores – os Procons - e à aplicação de multas.

A medida deve reduzir as dores de cabeça em casos de cobrança indevida, na avaliação de órgãos de defesa do consumidor. A mudança vai ajudar, principalmente, aqueles consumidores que adoram fazer compras ou contratar serviços por internet e/ou telefone, avalia Renata Reis, supervisora da área de serviços financeiros do Procon-SP. "Grandes empresas já informavam esses dados mesmo antes da lei", reforça.

Além da falta de atenção do consumidor, que muitas vezes não guarda a nota fiscal ou o contrato após fazer compra ou contratar serviço, muitas empresas informam apenas o nome fantasia nos boletos ao invés de sua razão social – nome da companhia que consta nos documentos e possível de ser pesquisado com o número do CNPJ.

Em muitos dos casos citados pelo Procon, de compras por internet e telefone, o consumidor nem sequer assina um contrato. “Outro benefício que a alteração traz é o fato de ter dados sempre atualizados”, disse.

Nome "sujo"
A Pro Teste diz que já viu casos de consumidores que tiveram o nome incluso nos serviços de proteção ao crédito por não conseguirem fazer contato com determinada companhia que enviou um boleto de cobrança indevida.
Para que o nome seja incluso nos serviços de proteção ao crédito, lembra Renata, do Procon-SP, não há prazo estabelecido. Fica a critério do credor, embora normalmente e dependendo do valor do contrato, a empresa prefira acionar o departamento de cobrança interno ou terceirizado para entrar em contato com o consumidor antes de tomar uma decisão mais drástica.

Caixa vai explorar bancarização de usuários do Bolsa Família

Valor Econômico

BRASÍLIA - O governo vai usar a Caixa Econômica Federal para ofertar serviços bancários a um terço dos 12,4 milhões de beneficiários do programa social Bolsa Família. O decreto presidencial que ratificará a medida deverá, entretanto, proibir a venda casada de serviços, e a concessão automática de crédito consignado.

O projeto de inclusão bancária dos beneficiários do Bolsa Família foi anunciado hoje pelo ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias, ao lado do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e da presidente da Caixa, Maria Fernanda Coelho.Hoje, quem recebe o Bolsa Família saca os benefícios (R$ 1,17 bilhão em outubro) de uma só vez, usando cartão eletrônico. Gestora dos benefícios, a presidente da Caixa disse que vai mandar cerca de 2 milhões de cartas aos usuários até o fim de 2009, e mais 2 milhões em 2010 informando sobre a abertura automática de conta simplificada (com cadastro reduzido).

Autor do projeto, o secretário-adjunto de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Gilson Bittencourt, disse que, por ora, apenas um terço dos 12,4 milhões cadastrados tem o CPF regular para a nova inclusão. Atualmente, 1,95 milhão de cadastrados no Bolsa Família já possuem contas simplificadas.Maria Fernanda disse que o projeto é parte "da missão de promoção da cidadania e redução das desigualdades sociais e regionais" da Caixa.Ao abrir uma conta simplificada, a Caixa deverá abrir linhas de microcrédito, ofertar seguro, entre outros serviços, admitiu ela. Gilson Bittencourt avalia que a bancarização é "uma medida a mais de cidadania". Segundo ele, desde a criação em 2004, já existem cerca de 5 milhões de contas bancárias simplificadas em todo o país.

Senado economiza R$ 110 milhões com redução de gastos

Valor Econômico

BRASÍLIA - As medidas para a contenção de gastos do Senado, como a diminuição do pagamento de horas extras e a regulamentação do uso da verba indenizatória e da cota de passagens aéreas, anunciadas em meio à crise que a Casa viveu há cerca de três meses, resultaram em uma economia de R$ de 110 milhões no orçamento deste ano. A informação foi dada ontem pelo diretor-geral do Senado, Haroldo Tajra, durante reunião da Comissão de Fiscalização.Segundo Tajra, se a comparação for feita com o orçamento do ano passado, que foi menor do que o de 2009, a economia sobe para R$ 250 milhões. "O número que apresentamos diz respeito ao comparativo do orçamento total do Senado de 2008 - orçamento original, mais crédito suplementar solicitado no ano passado - com a execução orçamentária de 2009. É daí que temos essa economia de R$ 250 milhões", afirmou."Este ano, não só não solicitamos o crédito suplementar, como temos uma economia de R$ 110 milhões", acrescentou Tajra. De acordo com o diretor-geral do Senado, a redução das despesas foi causada pelas medidas de contenção de gastos. "Essa economia foi obtida por meio da totalidade das medidas de contenção de despesas tomadas ao longo do ano, com relação ao [plano] de saúde, ao uso dos carros oficiais, a regulamentação da verba indenizatória e da cota de passagens aéreas e todas as demais economias, como o pagamento de horas extras, gratificação de comissão de servidores, impresso gráficos", disse.Ao lado da diminuição do pagamento das horas extras, Tajra disse que a renovação dos contratos terceirizados foram as principais razões da economia neste ano. "A média do que se pagava em horas extras era de aproximadamente R$ 8 milhões. Agora, estamos na média de R$ 6,5 milhões, uma economia de R$ 1,5 milhão", afirmou.

Bovespa despenca quase 4% nesta quarta; dólar sobe

Ultimo Segundo

As ações das empresas com maior influência sobre o índice também recuavam. Os papeis ordinários da Petrobras caíam 2,62%, enquanto os preferenciais registravam baixa de 3,06%. No caso da Vale, que divulga ainda hoje seu balanço trimestral, as ações ordinárias recuavam 4,73% e as preferenciais caíam 4,56%.
No mercado cambial, o dólar comercial opera em alta. Por volta das 14h32, a moeda norte-americana era negociada a R$ 1,755 para venda, em alta de 0,92% frente ao real.

Estrangeiros

Segundo analistas, a direção da Bolsa será ditada pelo comportamento dos investidores estrangeiros, que na terça-feira comandaram as vendas de papeis. "Mais isso não tem a ver com a taxação do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras). O mercado de ações estava muito esticado e precisa mesma de um ajuste agressivo", diz um operador.
Nesta quarta-feira, saiu o resultado das encomendas de bens duráveis nos EUA, que mostram crescimento de 1% em setembro, abaixo da previsão de expansão de 1,5%. Além disso, foi divulgado que as vendas de novas moradias nos Estados Unidos caíram inesperadamente 3,6% em setembro, registrando a primeira queda desde março, segundo dados do governo.

Balanço da Vale
Enquanto monitoram o apetite ao risco, os investidores na Bovespa aguardam o balanço da Vale, que sai após o encerramento do pregão. Analistas esperam queda de 62% no lucro líquido da mineradora no terceiro trimestre, para US$ 1,8 bilhão, ante os US$ 4,8 bilhões obtidos no mesmo período do ano passado, refletindo a combinação de preços mais baixos do minério de ferro e menores volumes de vendas. A ArcelorMittal, maior siderúrgica do mundo, anunciou uma queda de 76% na receita líquida para US$ 903 milhões, de US$ 3,82 bilhões um ano antes, e o lucro antes de impostos cedeu 81% para US$ 1,59 bilhão, abaixo do esperado. O resultado desapontador da ArcelorMittal contribui para queda das bolsas na Europa, na faixa de 1,5%.

Outra que decepcionou nesta quarta-feira foi a empresa alemã de tecnologia SAP, ao anunciar queda pior que o previsto, de 11% no lucro do terceiro trimestre para 435 milhões de euros (US$ 645 milhões) e informar que as vendas de softwares vão diminuir acima do previsto, por causa da queda dos gastos com consumo. Ainda no lado corporativo, mas no lado financeiro, o Santander, maior banco da Espanha e segundo maior do Brasil, anunciou nesta quarta uma receita líquida de 2,22 bilhões de euros (US$ 3,3 bilhões), praticamente estável em relação aos ganhos de um ano antes e dentro da expectativa dos analistas. O banco destacou que as operações no Brasil foram as principais responsáveis para os números do terceiro trimestre. O Santander Brasil teve lucro líquido consolidado de R$ 1,472 bilhão no terceiro trimestre deste ano, um aumento de 92,16% igual período de 2008.Os investidores vão acompanhar atentamente a estreia das ações da Cetip no Novo Mercado. A oferta pública inicial de ações (IPO, na sigla em inglês) da Cetip movimentou R$ 881,373 milhões. A empresa - que concentra o registro e negociações de títulos e derivativos não negociados em bolsa, o chamado mercado de balcão - obteve o preço de R$ 13,00 por ação, no piso da faixa indicativa, que variava entre R$ 13 e R$ 17.

Bolsas asiáticas
Nesta quarta-feira, as bolsas de valores da Ásia encerraram em baixa após uma queda na confiança do consumidor norte-americano reacender temores sobre o ritmo da recuperação econômica.

"As notícias sobre a confiança do consumidor norte-americano ressaltaram preocupações sobre a recuperação econômica dos Estados Unidos nos próximos meses", disse um operador de um banco japonês, em Tóquio.

(Com informações da Reuters e da Agência Estado)

Uruguai: quanto vale uma tradição republicana

Carta Maior
Flávio Aguiar

A candidatura do ex-guerrilheiro tupamaro, José Pepe Mujica, representa uma tradição republicana que, mesmo com as políticas conservadoras dos partidos tradicionais, deu ao Uruguai a condição de vanguarda educacional da América no começo do século XX. Foi essa tradição que a ditadura, iniciada em 1973, espezinhou. E foi ela que, depois, repôs o Uruguai de pé, com o fim da ditadura e terminou levando Tabaré Vasquez primeiro, à prefeitura de Montevidéu, e depois à Presidência da República. O artigo é de Flávio Aguiar.

Em fevereiro de 1845, ao fim da Revolução Farroupilha, reuniram-se em Ponche Verde, perto da atual cidade de Dom Pedrito, 13 generais do Exército Riograndense. Examinaram a proposta do Tratado de Paz que lhes fora encaminhado, por ordem de D. Pedro II, pelo Barão de Caxias, comandante das forças imperiais. 12 votaram pela paz. Bento Gonçalves da Silva, que não compareceu, acometido pela doença que dois anos depois o levaria à morte, votou por carta. Só um votou pela continuidade da luta: o general Antonio de Souza Netto, que, quase nove anos antes, proclamara a República. Teria ele então declarado que, diante da esmagadora maioria dos demais, também assinava o documento. Mas teria, de acordo com a tradição, ajuntado:“- Vou-me embora para a Banda Oriental [como às vezes ainda se chamava o Uruguai]. Lá é uma República.

E o meu sombrero cansou de dar barretadas a Imperador”.E se foi, levando com ele cerca de 200 ex-escravos e familiares que com ele tinham lutado na Revolução.É essa tradição republicana que, respeitada, dará a presidência do pequeno, mas grande país, a José Pepe Mujica, ex-guerrilheiro tupamaro, hoje senador da República, e ex-ministro da Agricultura do Governo de Tabaré Vasquez. É essa tradição republicana que, mesmo com as políticas conservadoras dos partidos tradicionais, deu ao Uruguai a condição de vanguarda educacional da América no começo do século XX. Foi essa tradição que a ditadura, iniciada em 1973, espezinhou. E foi ela que, depois, repôs o Uruguai de pé, com o fim da ditadura e terminou levando Tabaré Vasquez primeiro, à prefeitura de Montevidéu, e depois à Presidência da República.Em 2004 a TV Carta Maior cobriu ao vivo a posse de Tabaré Vasquez, desde um estúdio improvisado no alto de um hotel da capital. Mas fizemos também reportagens e entrevistas gravadas em outros locais, que editávamos e púnhamos no ar.Um dos pontos altos dessa cobertura, e também, devo dizer, de minha trajetória como jornalista, foi a entrevista com o então senador recém eleito e mais votado, José Pepe Mujica. Fizemos a entrevista, de que também participou sua esposa, Lúcia, em duas visitas à sua chácara. Foi memorável.Estávamos diante de um homem, ex-guerrilheiro, que passara anos de sua vida não só no cárcere, mas confinado numa cela que na verdade era um poço de pouco mais de dois metros de diâmetro, sem falar com ninguém. Contou-nos coisas terríveis e lindas ao mesmo tempo. Que conversava com os insetos. Que aprendera que as formigas gritam. Coisas assim.Mas o mais memorável de tudo é que estávamos diante de um homem que não só não saíra alquebrado ou mesmo quebrado dessa ignomínia, mas saíra também sem amargura. Era ( e é) um homem pronto para guardar e compartilhar a alegria de viver. Por isso, José Pepe Mujica é um fenômeno político admirável. Por isso, além de pelas razões de sua competência e de seu programa libertário, o Uruguai e sua tradição republicana merecem tê-lo como seu Presidente. Esperemos que a eleição, que começa neste domingo 25 e pode ter um segundo turno, o confirme.

27.10.09

Fique sabendo!




Quem é bom de bolha?

Folha de São Paulo
Vinícius torres Freire

O MEDO DA BOLHA parece complicar por toda parte o debate sobre as "estratégias de saída" da crise. "Bolha" é o nome que se dá de modo impreciso e tentativo a aumentos rápidos e exagerados do preço de ativos como ações ou imóveis, altas que podem ser invertidas ainda mais rapidamente, detonando quebras em cadeia nos mercados."Estratégia de saída" é o clichê que nomeia medidas que terão por objetivo reduzir os estímulos às economias hecatombadas pela crise. Isto é, medidas como elevar juros e reduzir gastos do governo a fim de evitar danos devidos ao excesso de estímulo, como inflação de preços e ativos. Governos de diversos países alertam que seus bancos centrais não devem começar a apertar as cravelhas cedo demais, de modo a não abortar a recuperação econômica.Mas as políticas fiscal (gastos públicos) e, em especial, monetária (de juros) muito frouxas podem não só resultar em inflação de preços de bens e serviços mas em inflação de ativos financeiros e correlatos ("bolhas", outra vez, embora ninguém saiba definir muito bem o que seja uma bolha, até que elas estourem).Nas economias ainda deprimidas e mais assentadas como a dos EUA e da Europa, essa discussão parece menos intensa que no mundo dito emergente ou nos países mais periféricos. No Brasil, os alertas de fogo começaram no paiol da moeda e da Bolsa. Alhures, a fumaça aparece em lugares mais ou menos diferentes.Mas é fumaça. O combustível, em toda parte, são políticas expansionistas de gastos e crédito, que têm seu efeito multiplicado pela vastidão de dinheiro barato que os EUA colocaram para rodar no planeta. Na Índia, os "analistas" locais dizem que a inflação está pegando, e que o BC indiano pode adotar medidas para conter a expansão de crédito bancário antes de começar a aumentar sua taxa "básica" de juros.Na Austrália, na Coreia, em Hong Kong e na Noruega, os preços dos imóveis estariam subindo rápido demais, dada a oferta de crédito barato, dentro e fora do país (os australianos, os "primeiros do G20 a elevarem" os juros depois da crise, dizem que um dos fatores principais da alta de juros foi o mercado de imóveis aquecido demais).Malásia e Tailândia interferem no mercado de câmbio a fim de evitar a supervalorização de suas moedas.

Na vizinhança, há preocupação com o assunto, pois o yuan chinês afunda com o dólar, o que pode prejudicar as exportações e a retomada econômica.Apesar do zum-zum-zum, há vasta divergência sobre os riscos e os meios de atenuá-los: 1) Pelo mundo, há "analistas" de bancos e consultorias para quem "os emergentes estão caros" (com preços exagerados para moedas, ações, imóveis etc.) e há quem diga o oposto, no mesmo dia, com as mesmas fontes de dados e usando os mesmos truques estatísticos; 2) Ainda há muita autoridade econômica e/ou monetária para quem não se deve tentar furar ou evitar bolhas com instrumentos como taxas de juros (uma arma sem mira para tal tipo de problema).Mas há muita gente preocupada com bolhas. A relativa simpatia com que (lá fora) foi recebida a taxação de investimentos em carteira indica que algumas ligeiras heterodoxias podem vir a ser praticadas por aí. E algumas outras por aqui também.

O dólar, nos derivativos

Jornal Cruzeiro do Sul


Alguns analistas pressentem que a instituição de um IOF de 2% não produziu mais do que uma coceira no câmbio e que é preciso mais para garantir o efeito pretendido de segurar o dólar. Entre as propostas está a de que o Banco Central se antecipe à excessiva entrada de dólares no mercado interno e atue agressivamente na ponta de compra em derivativos de câmbio.

Entre os economistas que já se manifestaram nessa direção, estão o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, o ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (governo Sarney), Luiz Gonzaga Belluzzo, e o ex-ministro da Fazenda Luiz Carlos Bresser-Pereira.
O que significa isso? Significa que o Banco Central deveria comprar ou vender moeda estrangeira nos mercados futuros, de maneira a inibir a aposta dos bancos em direção à valorização do real. Por que não o faz?

O importante aí é o objetivo da intervenção e não propriamente o segmento do mercado em que ocorre, se o de dólar pronto ou se o de derivativos. Nada haveria de errado se interviesse no mercado de derivativos e continuasse comprando moeda estrangeira apenas para evitar volatilidade ou para formar reservas. Quando negociou contratos de swap cambial antes, durante e depois da crise, o Banco Central operou no mercado de derivativos.

Se atuasse no mercado não mais para simplesmente impedir oscilações excessivas, mas também para impedir a valorização do real, o Banco Central seria obrigado a usar o único instrumento de que dispõe (a política monetária ou política de juros) para defender um piso (ou um teto) para o preço da moeda estrangeira em reais.

Nesse caso, sempre que a cotação do dólar resvalasse ou ameaçasse resvalar para abaixo desse piso, o Banco Central seria obrigado a comprar moeda estrangeira, no mercado à vista ou no futuro. A partir daí, a política monetária, que hoje está inteiramente voltada para o cumprimento da meta de inflação, passaria a ter uma função diferente. Seria usada para sustentar o câmbio.

Não dá para conciliar esses objetivos. Ou bem o Banco Central controla o câmbio ou controla a inflação. A partir do momento em que passasse sinais de que não admitiria que a cotação da moeda estrangeira em reais escapasse de determinado patamar, o mercado iniciaria uma especulação com juros, que inevitavelmente subiriam.

Além disso, sempre que emite reais para comprar moeda estrangeira, o Banco Central trata de esterilizá-los, ou seja, trata de tirá-los do mercado por meio da emissão de títulos: quem compra os títulos recolhe reais ao Banco Central e o efeito inflacionário fica neutralizado. Nesse caso, a tendência do câmbio, qualquer que seja ela, se perpetua porque a relação entre oferta e procura de moedas se restabelece com a esterilização. E, com o restabelecimento da relação anterior, o preço entre elas também tende a voltar ao nível anterior.

Não há nada de especialmente errado na atuação agressiva do Banco Central no mercado de derivativos, desde que eleja um só objetivo a cumprir e arrume o resto da economia em relação a ele. Mas não dá para pretender segurar o câmbio e, ao mesmo tempo, combater a inflação.

Juros vão continuar baixos no ano das eleições

Correio Braziliense
Daniel Pereira e Vicente Nunes

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, tiveram nesta segunda-feira (26/10) um almoço regado a boas notícias. A principal delas, que deixou Lula eufórico, foi a indicação de que não há, pelo menos no horizonte traçado na reunião da semana passada pelo Comitê de Política Monetária (Copom), qualquer necessidade de aumentar a taxa básica de juros (Selic) ao longo de 2010, quando o governo tentará eleger a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), para o Palácio do Planalto.

Em todos os modelos traçados pelo BC, mesmo com o Produto Interno Bruto (PIB) crescendo 5% no ano que vem, não haverá pressões sobre a inflação que justifiquem um novo arrocho monetário. Na pior das hipóteses, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deverá ficar no centro da meta perseguida pelo BC: 4,5%.Durante o almoço, segundo assessores do presidente da República, Meirelles assegurou que as preocupações dos analistas com a inflação são exageradas. Para ele, há uma capacidade ociosa ainda grande na indústria, que não sanciona aumento de preços aos consumidores. Além disso, o BC identificou a retomada de boa parte dos investimentos que foram arquivados no auge da crise mundial, pois os empresários perceberam que a retomada do crescimento é para valer. Esses investimentos tenderão a maturar justamente quando a ociosidade atual da produção será zerada.Outra observação do presidente do BC foi com relação ao mercado de trabalho. Apesar de o desemprego estar em queda e a massa salarial em alta, o consumo não tende a explodir, o que facilitaria reajustes pelo varejo. Foi exatamente isso que o Copom frisou no comunicado divulgado logo após sua reunião, na quarta-feira passada, ao se referir à "ociosidade dos fatores produtivos" como um dos motivos para a manutenção da Selic em 8,75% ao ano.Também joga a favor da inflação reduzida o dólar abaixo de R$ 1,80. Ainda que esse não seja o desejo de todo o governo, devido ao impacto negativo nas exportações, os custos de produção e de investimentos (máquinas e equipamentos importados) estão muito atrativos. O ponto fora da curva é a economia internacional. Há dúvidas quanto à capacidade de os países desenvolvidos sustentarem a retomada da atividade sem que a inflação volte.Mas não é somente a Lula que Meirelles assegura a estabilidade dos juros no ano que vem.

Em conversas com o primeiro escalão do governo, ele tem dito que são infundadas as previsões de elevação da Selic. E acrescentado que, mais cedo ou mais tarde, no meio da queda de braço com o BC, os agentes de mercado terão de rever suas projeções, de alta de até 3,5 pontos. Seria apenas uma questão de tempo. "Estão fazendo apostas erradas", repetiu Meirelles nas reuniões. "Fazem apostas erradas e perderão dinheiro", complementou um ministro com gabinete próximo ao de Lula. No núcleo duro do governo, há consenso de que, se há espaço para mudar os juros, é para baixo. Petistas lotados no Planalto afirmam que o crescimento registrado no próximo ano - de 5% ou mais - será acompanhado da expansão dos investimentos.Oficialmente, Meirelles disse ao Correio: "Não conversei sobre juros com o presidente nem nessa nem em outras reuniões".

FMI deveria ajudar Brasil a limitar capital externo, analisa FT

estadao.com.br
Daniela Milanese, da Agência Estado

LONDRES - O Fundo Monetário Internacional (FMI) deveria ajudar o Brasil a lidar com a entrada de capital externo, em vez de adotar postura negativa sobre a taxação criada recentemente pelo governo. A avaliação é dos acadêmicos Arvind Subramanian e John Williamson, do Peterson Institute, expressa em artigo desta segunda-feira, 26, no jornal britânico Financial Times (FT). Para eles, a taxação de 2% do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para a entrada de recursos externos no País é "muito importante, substancial e simbólica".

"O valor simbólico reside em sinalizar o fim de uma era na qual os mercados emergentes estavam enamorados pelo financiamento estrangeiro, expressando compromisso para tomar medidas a fim de moderar o fluxo de capital", escrevem, numa mostra de que a decisão do governo brasileiro continua repercutindo entre os especialistas internacionais.

Para os acadêmicos, a taxação aumenta o arsenal que pode ser usado para reduzir o superaquecimento das economias e ilustra o que os políticos podem fazer para deter bolhas de ativos incipientes. Eles criticam a falta de apoio do FMI para a medida brasileira. "Ao invés de jogar água fria, o fundo deveria ver isso como uma oportunidade intelectual", avaliam.

Conforme os especialistas, está correto o FMI continuar estimulando os países a se abrirem para o capital externo como um objetivo estrutural e de longo prazo. No entanto, deveria reconhecer que o aumento da entrada de recursos representa desafios macroeconômicos sérios, que requerem uma resposta diferente. "Para os mercados emergentes, o arsenal de políticas contra futuras crises deve trazer medidas para restringir o crescimento do crédito e a alavancagem de forma anticíclica."

Os acadêmicos avaliam que, se o FMI reconhecesse que limitar a entrada de recursos pode ser uma política pragmática, poderia eliminar o estigma pouco amigável do mercado sobre esse tipo de medida. Eles avaliam que o mundo precisa de um viés menos doutrinador para o fluxo de capital externo. "Ajudar o Brasil em sua decisão da semana passada, ao invés de emitir uma resposta negativa, poderia sinalizar que o FMI está exercendo um papel construtivo para facilitar essa mudança."

Otimismo racional

Além desse artigo, o Financial Times traz hoje reportagem apontando que há um "otimismo racional" sobre a economia brasileira. Eventos que teoricamente poderiam assustar os investidores - como a possível saída de Henrique Meirelles do Banco Central e o IOF sobre o capital externo - não são capazes de abalar o humor. O fato de sediar a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016 ampliou o sentimento de que o País entrou no cenário mundial.

Ainda assim, os brasileiros não estão sendo arrebatados pela situação, segundo o FT. Um dos motivos é a presença do Estado na economia, que continua sendo sentida, como mostram as pressões do governo sobre a Vale. Além disso, há outras preocupações a serem resolvidas antes que o País cumpra o seu potencial.

Em entrevista ao jornal britânico, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso diz que há quatro desafios: infraestrutura, educação, meio ambiente e violência. "Otimismo racional, ao invés de exuberância irracional, é o que se encontra entre os líderes de bancos e empresas em São Paulo", afirma o FT.

Conforme a publicação, também há incerteza sobre a transição para o próximo governo. Dilma Rousseff, candidata escolhida de Lula, é uma "dura tecnocrata". José Serra, o provável candidato de oposição, tem uma "natureza similar". "Ambos sofrem de falta de carisma."

Chávez, ameaça ao Mercosul

estadao.com.br

Os senadores brasileiros vão decidir nos próximos dias se deverão sujeitar os interesses do Mercosul e, portanto, os do Brasil ao presidente Hugo Chávez. A escolha será essa mesma e nenhum político responsável tem o direito de manter ilusões. Se a Venezuela for admitida no bloco, todas as negociações conjuntas passarão a depender da opinião, das ambições de poder e das posições ideológicas de um parceiro pouco disposto a reconhecer limites aos seus projetos. Como sócio efetivo, Chávez não hesitará em usar seu poder de veto para impor sua vontade nem renunciará a fazer do Mercosul um instrumento de seus objetivos políticos e uma arma para suas conquistas. O Mercosul tal como existe não lhe interessa. Ele mesmo o declarou publicamente.

Isso é um dado e nenhum senador brasileiro deve ignorá-lo. Mas sua insatisfação não se deve, com certeza, à escassez de acordos comerciais importantes celebrados pelo bloco nem às suas deficiências como união aduaneira e até mesmo como zona de livre comércio. Um Mercosul à moda de Chávez só pode ser uma associação ajustada à sua alternativa bolivariana.A Comissão de Relações Exteriores do Senado deverá votar nesta quinta-feira o protocolo de adesão da Venezuela. Depois o assunto será submetido ao plenário. Até lá os senadores serão fortemente pressionados por grupos empresariais brasileiros e venezuelanos favoráveis à aprovação do protocolo. Os defensores da pretensão venezuelana chamam a atenção para o crescimento do comércio entre Brasil e Venezuela e para a importância do mercado venezuelano para exportadores brasileiros de bens e serviços. Mas não se limitam a apontar dados positivos.

Acenam também com o risco de retaliações, isto é, com a perda de preferências comerciais. "A expansão do Mercosul não pode ser vista sob o viés político ou ideológico", disse o presidente da Federação de Câmaras de Comércio e Indústria Brasil-Venezuela, José Francisco Marcondes Neto. São argumentos paupérrimos. O comércio bilateral cresceu nos últimos dez anos porque houve interesse dos dois lados. Essa evolução foi independente do possível ingresso da Venezuela no Mercosul. Além disso, as principais concessões foram feitas pelo Brasil. O governo do presidente Hugo Chávez sujeitou as transações bilaterais a uma política de câmbio discriminatória, com desvantagem para os empresários brasileiros. Essa política também resultou em atrasos de pagamentos. Exportadores brasileiros tiveram de pressionar Brasília para conseguir apoio à sua pretensão de receber o pagamento de suas vendas. O presidente Chávez certamente não adotará outro estilo de política, se a Venezuela se tornar sócia do Mercosul, nem renunciará à sua prometida política de proteção a setores industriais para substituição de importações.Quanto ao viés ideológico, é um problema real, mas o argumento foi invertido.

Chávez nunca escondeu sua pretensão de submeter o Mercosul à sua visão ideológica. Só por extrema ingenuidade alguém poderá esperar de Chávez um comportamento diferente, quando tiver poder de voto no bloco. Os senadores agirão mais sensatamente se levarem em conta as advertências da Confederação Nacional da Indústria (CNI), contrária ao ingresso imediato da Venezuela.O Mercosul, enfim, foi concebido com objetivos muito mais ambiciosos que o aumento da cooperação regional e do comércio entre seus membros. Seus quatro sócios fundadores poderiam atingir esses fins com a simples formação de uma área de livre comércio. Mas seus criadores pretenderam fazer da integração regional uma base para a inserção nos mercados globais. Como sócios de uma união aduaneira, os quatro países teriam de operar com uma tarifa externa comum e só poderiam negociar em bloco acordos de livre comércio com parceiros de fora - como a União Europeia, por exemplo. Da mesma forma, nenhum de seus membros poderá agir isoladamente ao oferecer concessões na Rodada Doha. Os governos de Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai têm tido dificuldades para combinar os interesses nacionais em negociações como essas. A presença de Hugo Chávez apenas complicará todo o processo e aprofundará as divergências entre os sócios do Mercosul. Por seu mau funcionamento, o bloco já tem sido um peso para o Brasil. Com Chávez, será um peso muito maior e muito mais prejudicial.

Para além do PIB e do IDH

Valor Econômico


Do ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Miguel Jorge, ao defender que os Estados produtores de minério recebam uma compensação maior, por meio de tributos, pelo impacto causado pela mineração.
José Eli da Veiga é professor titular da Faculdade de Economia (FEA) e orientador do Programa de Pós-Graduação do Instituto de Relações Internacionais (IRI) da Universidade de São Paulo, escreve mensalmente às terças. Página web:
www.zeeli.pro.br


Quase toda a capacidade cerebral dos seres humanos é usada para continuar crendo no que já acostumaram a aceitar como verdade. Ínfima é a disponibilidade para se colocar em dúvida alguma convicção. Pior: a chance é nula se a novidade esbarrar em ideias repisadas como se fossem insuspeitas conclusões científicas. Detesta-se qualquer pensamento que abale algum fundamento aprendido na escola, principalmente nos grandes manuais usados no ensino superior. Por isso, reflexões que rompem visões convencionais estão fadadas à rejeição do silêncio.
Só o fenômeno descrito no parágrafo acima pode explicar o desdém com que está sendo tratada a decisiva contribuição da CMEPSP: comissão que ficou mais conhecida pela trinca de nomes de seus três principais coordenadores — Joseph Stiglitz, Amartya Sen e Jean-Paul Fitoussi — do que por sua missão de rever a “mensuração do desempenho econômico e do progresso social”.


Das quinze recomendações do relatório final, as cinco que se referem especificamente à superação do tosco PIB não poderiam ser mais incisivas: 1) passar a olhar para renda e consumo em vez de olhar para a produção; 2) considerar renda e consumo em conjunção com a riqueza; 3) enfatizar a perspectiva domiciliar; 4) dar mais proeminência à distribuição de renda, de consumo e de riqueza; 5) ampliar as medidas de renda para atividades não-mercantis.
Trata-se de um claro reconhecimento de que está inteiramente obsoleto o viés produtivista que orientou a montagem do atual sistema de contabilidades nacionais. No contexto de meados do século passado, a maior preocupação dos técnicos que o conceberam só poderia ter sido mesmo o aumento da produção, como está muito bem documentado no melhor livro sobre o tema: “A History of National Accounting”, de André Vanoli (IOS Press: 2005; originalmente em francês, editora La Découverte: Paris, 2002). Porém, passados uns 60 anos, chega a ser assustador que o desempenho econômico das nações continue a ser medido quase que exclusivamente por aumentos da produção mercantil interna e bruta.

A produção pode aumentar enquanto a renda diminui e vice-versa, desde que se leve em consideração a depreciação, os fluxos de renda para dentro e para fora do país, e as diferenças entre os preços de produção e de consumo. Além disso, mesmo a renda e o consumo não serão bons indicadores de desempenho se não estiverem cotejados à riqueza. Para que se tenha um verdadeiro balanço da economia nacional, é preciso que ela imite a contabilidade das empresas, pois são cruciais as contas de patrimônio e as de endividamento.

Segundo a CMEPSP, a melhor maneira de superar as limitações da vetusta contabilidade que leva ao PIB é adotar o que chama de “perspectiva domiciliar”. Em países da OCDE que já fazem esses cálculos, ficou bem claro que a renda domiciliar real aumenta menos que o PIB. É preciso levar em conta os pagamentos de tributos que vão para o governo, os benefícios sociais alocados pelo governo, e os pagamentos de juros que os domicílios fazem às corporações financeiras. Também é crucial que não sejam ignorados os serviços não-monetários prestados pelo governo às famílias, principalmente pelos sistemas de saúde e de educação.

Ainda sobre o PIB, a Comissão também preconiza mais audácia no sentido de que a mensuração do desempenho econômico venha a incluir atividades nãomercantis, principalmente as de serviços pessoais decorrentes de relações de parentesco. Sugere que o melhor ponto de partida poderá ser a realização de estimativas sobre o uso do tempo pelas pessoas.
Além de medir direito o desempenho econômico, também será necessário avaliar a qualidade de vida sem cair na ambiguidade do IDH: Índice de Desenvolvimento Humano. Neste caso, a proposta que acabou vingando é tão complexa que estará fora do alcance de países que não tiverem sofisticados sistemas públicos de estatística. Para começar, a Comissão gostaria que todo o acúmulo já existente sobre avaliações subjetivas de bem-estar fosse incorporado em avaliações de qualidade de vida. E isso, mesmo depois de apontar quais são as questões ainda não resolvidas pelas pesquisas voltadas à aferição de satisfação com a vida e de experiências hedônicas. A ideia é que as agências oficiais de estatística ao menos comecem a levá-las a sério, incluindo em seus levantamentos as questões que já se mostraram válidas em “surveys” não-oficiais e menos abrangentes.

Outra grande ênfase do relatório está na terceira dimensão: a da absoluta necessidade de que os aspectos propriamente ambientais da sustentabilidade sejam acompanhados pelo uso de indicadores físicos bem escolhidos. A rigor, isso poderia ser interpretado como uma adesão à abordagem da Pegada Ecológica. Porém, o relatório sintetiza muito bem as várias críticas já feitas à metodologia da pegada, destacando cinco problemas: os que se referem a terras utilizadas pela agropecuária, a terrenos destinados à construção, a recursos pesqueiros e florestais e à maneira de calcular a pegada carbono, que já constitui mais de 50% da pegada ecológica. E são ainda mais incisivas e meticulosas as críticas aos demais indicadores de sustentabilidade já propostos.

Resumindo, o recado é claro: buscar bons indicadores não-monetários da aproximação de níveis perigosos de danos ambientais, como, por exemplo, os que estão associados à mudança climática. É possível deduzir, então, que se as intensidades-carbono das economias viessem a ser bem calculadas, poderiam ser os indicadores das contribuições nacionais à insustentabilidade global. E, melhor ainda, se surgissem medidas parecidas para o comprometimento dos recursos hídricos e para a erosão de biodiversidade. Esse trio seria suficiente para mostrar a que distância se está da sustentabilidade.

Sem engenho, nem arte

Valor Econômico
Antonio Delfim Netto

Inovação e desoneração tributária. É o que a indústria brasileira precisa para voltar a ter condições de enfrentar a competição interna e vencer a externa. Com a queda do ritmo da economia em todo o mundo houve forte retração nos investimentos da indústria em inovação tecnológica, inclusive no Brasil. Nosso setor manufatureiro sustentou um nível razoável de atividade graças à redução temporária de impostos e à capacidade de conciliação de empresários e trabalhadores, o que manteve empregos, a renda salarial e , em consequência, o consumo.
Com um progresso muito lento na política monetária, as altas taxas de juros continuam dando suporte a uma supervalorização cambial, que desencoraja os investimentos no setor exportador e reduz a competitividade de nossa indústria. Já que não se tem no horizonte perspectiva próxima de reversão desse castigo, restaria concentrar atenções naqueles dois fatores citados no início.
Quanto à desoneração tributária, em primeiro lugar: tornou-se evidente que a sustação da cobrança de impostos em produtos de grande apelo de consumo das famílias não resultou em nenhuma ameaça ou dano ao equilíbrio fiscal. Na emergência da crise, o governo Lula acabou realizando uma minirreforma tributária com grande sucesso, cujos efeitos benéficos são irrefutáveis. É algo que pode ser reproduzido, com inteligência, elegendo-se gradativamente os setores da indústria com potencial de expandir as exportações.
Após um ano de crise, os investimentos em novas tecnologias foram abandonados em muitos países. E a redução dos níveis do comércio global deixou de favorecer o intercâmbio e a absorção de moderna tecnologia entre os países.
Num balanço preliminar, já começam a aparecer os resultados de pesquisas quantificando a queda dos investimentos em inovação tecnológica nos Estados Unidos e nos demais países da OCDE. De acordo com informações, citadas numa reportagem especial da revista “The Economist” (21/9/2009), os gastos em P&D das grandes companhias diminuíram e os investimentos em empresas novas e inovadoras entraram em colapso. Historicamente, esses gastos flutuam de acordo com a renda: quando o crescimento declina em 2%, o investimento cai 3%. Pior, os cortes incidem geralmente naqueles projetos de longo prazo, que podem produzir as maiores inovações.
O conhecimento desses fatos fez renascer rapidamente a discussão nos países desenvolvidos sobre a necessidade uma nova “política industrial”, sustentada pelo estímulo aos investimentos em tecnologia. Aquilo que era uma heresia, condenável nos países em desenvolvimento (nos anos 50 e 70, no Brasil por exemplo), voltou à moda, com força. A estrela do prêmio Nobel de Economia, Robert Solow, voltou a brilhar: ele demonstrou que, dentre os fatores que produziram o desenvolvimento econômico nos primeiros 50 anos do século XX, a engenhosidade foi de longe o mais importante, pois respondeu por 88% do crescimento da produtividade por hora de trabalho.
As primeiras conclusões são que os países desenvolvidos, se não quiserem perder a corrida do crescimento para os emergentes mais ágeis, deverão realizar políticas industriais que deem suporte aos investimentos em tecnologia inovadora. As iniciativas do governo americano, anunciadas pelo presidente Obama em diferentes oportunidades, não deixam dúvidas sobre o volume gigantesco de recursos que estão colocando à disposição das universidades, centros de pesquisa e diretamente nas empresas que apresentam projetos inovadores e avançada tecnologia.
O Brasil tinha desenhado todo um projeto de política industrial, que deixou de ser iniciado no segundo semestre de 2008 por conta da emergência produzida pela crise financeira. Ela se propunha a acelerar as desonerações tributárias e estimular os investimentos em tecnologia para aumentar a produtividade e a competitividade da indústria exportadora.
O atual estágio de “emergência” não justifica o adiamento ou o abandono da nova política. Se olharmos o comércio exterior brasileiro, atualmente temos emergências graves, representadas pela queda de 30% do valor das exportações da indústria em um ano, e por um avanço cada vez maior das importações de produtos que recebem “subsídios” (de crédito, cambiais e salariais) escandalosos, competindo deslealmente com nossos pequenos, mini e médios empresários.

Lula deve nomear economista para vaga de conselheiro do Cade

Valor Econômico

O economista Ricardo Machado Ruiz deverá ser nomeado hoje, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, para o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão do Ministério da Justiça. Ruiz conta com apoios importantes para a vaga, como o do presidente do BNDES, Luciano Coutinho, e o do ministro da Fazenda, Guido Mantega. Será a indicação de Lula
24a para o Cade. Dessas, duas foram retiradas, após o governo avaliar que havia o risco de não aprovação dos nomes (Denise Abreu e Cleveland Prates Teixeira), e uma não foi confirmada, porque houve desistência do indicado (o economista Enéas Souza).


Ruiz deverá ocupar a vaga deixada pelo economista Paulo Furquim, que ocupava o posto de decano do órgão antitruste e renunciou ao mandato em setembro. A indicação foi definida num acerto entre as secretarias de Acompanhamento e de Direito Econômico (Seae e SDE), dos ministérios da Fazenda e da Justiça. As duas secretarias têm peso nas nomeações para o Cade. A Seae faz os pareceres para os casos de fusões e aquisições, e a SDE cuida das investigações de cartéis. A SDE chegou a indicar outro nome dentre os seus quadros, mas como a vaga aberta era de um economista, a Seae, da Fazenda, pediu prioridade na indicação.

Ruiz fez mestrado em economia na Unicamp, onde teve Coutinho comoorientador. Concluiu doutorado na mesma área nos Estados Unidos, na New School for Social Research. Atualmente, é professor da UFMG. Possui vasto currículo acadêmico, o que deve facilitar a sua aprovação no Senado, onde será sabatinado pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Porém, os maiores problemas para a aprovação de nomes para o Cade estão no plenário do Senado.

Vários senadores têm recebido reclamações de grandes empresas que sofreram reveses no órgão antitruste e contestam a política rigorosa adotada na gestão do presidente Arthur Badin. No último teste do Cade no plenário do Senado, em 26 de agosto, o indicado ao cargo de procurador-geral do órgão antitruste, Gilvandro Araújo, foi aprovado por margem apertada de votos: 29 a favor e 24 contra.

No início de outubro, o Cade condenou pela primeira vez em sua história um senador. Adelmir Santana (DEM-DF) terá de pagar R$ 13 mil por ter ajudado a formar a Rede da Economia, uma associação de drogarias que se reuniam para combinar descontos de remédios. Santana foi presidente da associação e defendeu-se alegando que o objetivo era baixar os preços. O Cade considerou que o acordo de preços existiu e prejudicou a competição entre as farmácias no DF. A associação foi condenada a pagar R$ 60 mil e as 26 drogarias, entre 1% e 1,5% do faturamento. Após essa condenação, a Comissão de Ciência e Tecnologia do Senado aprovou o projeto que reformula o Cade. O texto ainda terá de passar por mais três comissões antes da aprovação final.

26.10.09

Governo cobra do varejo contrapartida para estender IPI

Folha de S.Paulo (SP)

O governo pretende impor condições ao setor varejista para renovar o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) reduzido para os produtos da linha branca, como geladeiras e fogões.
O Ministério da Fazenda está preocupado em baratear o crédito para o consumidor na aquisição desses produtos e pressionará os empresários nesse sentido antes de anunciar uma provável prorrogação do benefício tributário.
A Folha apurou que o tom será de cobrança na reunião de hoje entre o ministro Guido Mantega (Fazenda) e a presidente do Instituto para Desenvolvimento do Varejo, Luiza Trajano (Magazine Luiza), para discutir o assunto. Outros dirigentes do setor varejista devem acompanhar a reunião.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tende a prorrogar a redução do IPI.
Para o governo, as linhas de crédito ao consumidor ainda estão muito caras, demonstrando que o varejo não repassou integralmente à população os efeitos do desconto do imposto.
Em conversas com interlocutores do governo, o setor varejista vem tentando se justificar, alegando que ainda sofre com os efeitos do encarecimento do crédito por conta da crise econômica que eclodiu no Brasil no final do ano passado e afetou mais diretamente o custo dos financiamentos.
Segundo assessores de Mantega, no encontro de hoje o ministro não deverá anunciar novidades em relação ao IPI. A tendência, no entanto, é que o governo decida até sexta-feira pela prorrogação do IPI reduzido para a linha branca até o final do ano.
O presidente disse à Folha na última quarta-feira que tem simpatia pela manutenção do desconto, pois gostaria que a população tivesse a "sensação de ganho" ao gastar o 13º salário nas compras de Natal.
Até agora, o desconto no IPI para a linha branca representou para a Receita Federal uma perda de arrecadação de R$ 264 milhões. Inicialmente, a medida vigoraria apenas em maio e junho, mas o governo acabou estendendo o prazo até ao menos o final de outubro.

Apelos
Na semana passada, na primeira reunião do Grupo de Acompanhamento do Crescimento -que foi rebatizado de Grupo para o Avanço da Competitividade-, Mantega ouviu apelos de representantes das entidades do varejo para renovação do IPI reduzido.
De acordo com relatos de participantes do grupo, ao ministro foram apresentados dados sobre os efeitos da medida na geração de empregos e no aumento das vendas. Mantega reconheceu que a desoneração gerou efeitos positivos, mas não sinalizou se haverá ou não a prorrogação do benefício tributário.
Na reunião, os representantes do setor da construção civil -que é beneficiado com a redução de IPI para material de construção- ainda argumentaram que o setor trabalha com tempo mais longo de maturação de seus projetos.
Assim, a não renovação do imposto reduzido, alertaram, poderá punir o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida, um dos principais do governo federal.
O governo já abriu mão da arrecadação de R$ 19,5 bilhões neste ano por conta de desonerações tributárias com o intuito de atenuar os efeitos da crise. Só o setor automotivo foi beneficiado com R$ 4 bilhões em incentivos diretos à produção de veículos.

Estudo mostra que política pública reduz pouco pobreza

Valor Economico (SP)

As políticas públicas de redução da pobreza e da desigualdade estão na direção correta, mas a força delas é insuficiente para resgatar as regiões mais pobres do país, especialmente Nordeste e Norte. Essa é a principal conclusão de um trabalho do Laboratório de Estudos da Pobreza (LEP) da Universidade Federal do Ceará (UFC) sobre o que ocorreu nos 27 Estados e no Distrito Federal, de 2006 a 2008.

O economista e professor Flávio Ataliba Barreto, coordenador da pesquisa, explica que foram usados dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), do IBGE, com informações de renda, desigualdade e pobreza. O bem-estar foi apurado a partir do índice elaborado pelo economista indiano Nanak Kakwani, que mede o crescimento da renda das camadas mais pobres da população.

Barreto comenta que, apesar da queda da desigualdade, movimento que vem sendo verificado desde 2001, o Nordeste continua muito atrasado, com renda baixa e desigualdade alta. Ele lamenta que, nessa região, as políticas públicas não conseguiram reverter a situação "preocupante" mantida pelo baixo nível educacional. Na interpretação do professor da UFC, falta perspectiva para esse grupo de nove Estados que têm 28% da população brasileira, mas concentram 49% dos pobres. "Não há muito a comemorar no Nordeste. A região tem grande população, mas ainda é bastante dependente das transferências de renda", conclui.

De 2006 a 2008, o que ocorreu com os dois Estados com a maior proporção de pobres na população - Alagoas e Maranhão - é exemplo dessa falta de perspectiva. Os dois deram saltos, mas, como a base de comparação é muito baixa, o movimento não significa muito para as pessoas.

O índice de Kakwani mostra que Alagoas ficou em sétimo lugar na lista do crescimento da renda favorável aos mais pobres, mas isso foi insuficiente para tirá-lo do incômodo topo no rol das unidades da federação que têm mais pobres na população. Alagoas tinha 65,27% da população na faixa da pobreza em 2006, o que significa renda familiar per capita de até meio salário mínimo. Em 2008, essa parcela recuou para 56,36%.

A situação do Maranhão também evoluiu positivamente quando é medida a evolução da renda dos mais pobres. O Estado, de 2006 a 2008, ficou no honroso sexto lugar nessa classificação, mas continuou em segundo lugar no "ranking" dos que têm mais pobres na população. Em 2006, eram 63,61% com renda familiar per capita de até dois salários mínimo e recuaram para 54,19% dois anos depois.

Os números da proporção de pobres na população revelam que todos os Estados e o Distrito Federal reduziram o número de pessoas que têm até meio salário mínimo como renda per capita familiar. De 2006 a 2008, o melhor desempenho é do Paraná. O Estado tinha 25,19% nessa situação e passou a ter 18,12%. Goiás aparece logo depois porque reduziu essa parcela da população de 30,87% para 22,20%. Em terceiro lugar está Mato Grosso, com queda de 33,10% para 24,18%.

As reduções mais tímidas da proporção de pobres na população, nesses dois anos, foram de Roraima (42,64% para 37,62%), Amazonas (47,36% para 41,88%) e Paraíba (53,98% para 48,98%).

Barreto informa que, na análise do LEP, o cenário que apresenta a melhor síntese é a comparação, entre os Estados, dos respectivos índices de bem-estar de Kakwani. Segundo ele, dessa maneira é possível medir se a renda dos mais pobres aumentou. A fórmula desse índice de Kakwani considera variações da renda geral com o movimento verificado na renda das camadas mais pobres da população.

Entre 2006 e 2008, Rondônia foi o único Estado que teve contração da renda geral, mas, apesar disso, houve aumento de 18,91% da renda dos mais pobres. Em quatro unidades - Distrito Federal, Mato Grosso, Paraíba e Tocantins - foi registrada expansão da renda geral nesse período, mas acompanhada de aumento da desigualdade.

O trabalho mostra que os demais 22 Estados tiveram, de 2006 a 2008, expansão da renda geral com perfil favorável à elevação da renda dos mais pobres.

Os melhores desempenhos de crescimento da renda dos mais pobres, sob a ótica do índice de Kakwani, foram de Rondônia, Roraima, Acre, São Paulo e Amapá. O índice de bem-estar de Amartya Sen considera as variações da renda e da desigualdade, mas, na opinião de Barreto, falha ao omitir se os ricos perderam renda ou se os pobres foram beneficiados.

Isolando a variação da desigualdade nas 27 unidades da federação, o LEP verificou que, de 2006 a 2008, a situação deteriorou-se em Tocantins, Paraíba, Mato Grosso, Goiás e Distrito Federal. O coordenador do estudo revela que está sendo preparada uma análise mais profunda das causas da redução da desigualdade no Brasil. Os primeiros sinais apontam para o aumento do salário mínimo no Sudeste e os benefícios previdenciários e transferência de renda no Nordeste.

Outra boa notícia, segundo Barreto, foi a redução do número absoluto de pobres em todos 26 Estados e no Distrito Federal. De 2006 a 2008, a maior diminuição, 26,68%, foi no Paraná. Em segundo lugar, veio Goiás com 25,89%. O terceiro melhor desempenho foi do Mato Grosso, com queda de 24,41% do número absoluto de pobres. Na outra ponta da lista, as reduções mais modestas foram em Roraima (7,44%), Paraíba (7,63%) e Amazonas (8,33%).

É preciso novo sistema global, diz Soros

Folha de S.Paulo (SP)


Para megainvestidor, crise

mostrou necessidade de reforma do sistema monetário e o real deve fazer parte do novo modelo Soros crê que mercado deve seguir em alta até o fim do ano porque EUA não poderão desmontar até lá estímulos que garantem recuperação

CHRYSTIA FREELAND
DO "FINANCIAL TIMES"

Depois de interromper a aposentadoria para reassumir a administração do seu fundo na tentativa de protegê-lo na crise, o megainvestidor húngaro-americano George Soros, 79, volta a se afastar do cotidiano do mercado devido à sensação de que o pior de fato ficou para trás. "A tempestade passou."
Entretanto, alerta, a fraqueza dos EUA e os limites da China em assumir o papel de locomotiva mundial impedirão que a atividade global nos próximos anos se assemelhe, em ritmo, à vista nos últimos anos.
Na opinião de Soros, este é o grande momento para uma efetiva reforma do sistema monetário global a fim de que um número maior de divisas -inclusive o real brasileiro- passe a fazer parte das reservas internacionais, diminuindo, dessa maneira, a dependência coletiva do dólar americano.


PERGUNTA - Como o senhor vê a atual situação da economia global?
GEORGE SOROS - Certamente os mercados financeiros se recompuseram e começaram a funcionar novamente, e a economia mundial superou o choque. Então há uma retomada, mas acho que o mundo vai demorar bastante para absorver o que aconteceu nessa crise, e a principal fonte de problemas está nos EUA. É lá que os consumidores gastaram mais do que ganharam por 25 anos, e o consumo corresponde a mais de 70% da economia do país, mas agora isso terá de mudar, mas levará tempo.
Também houve a questão do sistema bancário, que basicamente estava falido. Está no fundo do poço e tem que construir o seu caminho para fora do buraco. Isso está acontecendo em um ritmo bem acelerado porque os bancos emprestam a custo zero e compram bônus de dez anos do governo com rendimento de 3,5% [ao ano], e essa é uma velocidade de ganho bem rápida para risco nenhum.
Então, eles vão conseguir sair do buraco, mas também vai levar tempo. E ainda tem todo o setor imobiliário comercial, com perdas ainda desconhecidas. Portanto, a fraqueza do mundo estará principalmente nos gastos do consumidor americano e no, digamos, declínio do sistema bancário.

PERGUNTA - E essa fraqueza nos EUA é tão grave que possa causar uma recuperação em forma de W, com uma nova queda?
SOROS - Bem, eu acho que pode acontecer uma outra queda nos mercados acionários porque neste exato momento estamos aproveitando a multiplicação da confiança e existe uma certa esperança de que esta seja uma crise como as anteriores, uma retomada em forma de V. Então, quando essa esperança não for satisfeita, acho que haverá...

PERGUNTA - Por que o senhor acha que não será satisfeita?
SOROS - Posso estar errado. Já estive errado outras vezes, mas não vejo de onde pode vir o crescimento nos EUA.

PERGUNTA - Considerando a contínua fragilidade da economia americana, as pessoas estão certas de se preocuparem com o dólar?
SOROS - Claro que estão, e o dólar é a uma moeda muito fraca com a exceção de todas as outras. Então existe uma falta de confiança geral nas moedas e uma fuga para ativos reais. Os chineses continuam administrando um grande superavit comercial e ainda estão acumulando ativos, e basicamente o yuan está permanentemente desvalorizado porque está amarrado ao dólar.
Há uma diversificação, passando dos ativos que normalmente são controlados pelos bancos centrais para outros tipos, especialmente na área de commodities. Há uma puxada no ouro, um fortalecimento do petróleo, o que de certa forma é uma fuga de moedas.

PERGUNTA - Vai haver um ponto de inflexão do dólar ou essa situação atual vai continuar?
SOROS - Enquanto o yuan estiver amarrado ao dólar, não vejo como a decadência do dólar possa ir longe. Mas, claro, em alguma medida isso é bastante útil porque, com os consumidores americanos economizando mais e gastando menos, as exportações podem ser um jeito de a economia dos EUA se equilibrar. Então, uma decadência ordenada do dólar é na verdade desejável.

PERGUNTA - É necessária uma nova organização monetária mundial?
SOROS - Acho que o sistema está quebrado e precisa ser reconstruído. Não temos condições de seguir com esses desequilíbrios crônicos e crescentes nas finanças internacionais. É necessário um novo sistema de moedas, e os direitos especiais de saque [do FMI, calculado com base na cotação, em dólar, de uma cesta de quatro divisas: o dólar, o euro, o iene e a libra esterlina] de fato fornecem as linhas gerais de um sistema.
É burrice dos EUA resistir ao uso amplo desses direitos especiais de saque. Eles poderiam ser muito úteis agora, quando existe uma diminuição da demanda. Poderia na verdade ser internacionalmente criada uma moeda por meio dos direitos de saque, e isso já foi feito. Foram lançados US$ 250 bilhões, e é um passo muito útil.

PERGUNTA - Que tipo de acordo o presidente Obama deve buscar na viagem à China em novembro?
SOROS - Acho que já está na hora de envolver a China na criação de uma nova ordem mundial, uma ordem financeira global. Os chineses são um membro relutante do FMI. Participam, mas não dão muita contribuição porque não é uma instituição sua. Os direitos de voto não correspondem ao seu peso, então eu acho que é necessária nova ordem mundial de cujo processo de criação a China participe e com a qual concorde. A China tem de ser dona da nova ordem da mesma forma que, digamos, os EUA são donos do Consenso de Washington, que é a ordem atual, e acho que esse seria um sistema mais estável onde haveria políticas coordenadas. Acho que a estrutura de tal ordem já existe porque o G20, ao concordar em fazer reformas, efetivamente está se movendo nessa direção.

PERGUNTA - O sr. acha possível convencer a China a valorizar o yuan?
SOROS - Acho que eles têm defendido isso, então eu lançaria mão das suas próprias palavras para fazer do yuan parte do sistema de direitos de saque, embora a moeda não seja conversível. Em outras palavras, o yuan deveria ser uma das moedas usadas no sistema de direito especial de saque, e essa ideia vai convencê-los.

PERGUNTA - Isso é possível apesar da não convertibilidade do yuan?
SOROS - Sim. Sim. Já se pensou nisso antes, e eu acho que o real, do Brasil, também deveria ser parte do sistema. Acho que a gama de moedas da cesta pode e deve ser aumentada.

PERGUNTA - E a preocupação dos americanos de que apoiar essa fuga do dólar como a moeda de reserva mundial em última instância significa enfraquecer sua economia?
SOROS - Beneficiamo-nos muito [do atual sistema], mas creio que abusamos e não acho que podemos continuar abusando. Então, não é necessariamente do nosso interesse ter o dólar como a única moeda mundial porque a economia global em crescimento necessita de uma moeda adicional e, se o dólar é essa moeda adicional, significa que os EUA precisam ter um deficit em conta corrente crônico. Isso não é bom. Acho que é do nosso interesse reformar a estrutura.

PERGUNTA - Se os EUA não participarem ativamente desse tipo de renegociação das finanças globais, o que vai acontecer? Qual é o pior cenário?
SOROS - A China vai adotar a estratégia bilateral. Já a emprega. Os chineses já possuem um acordo de compensação com a Argentina e acredito que estejam trabalhando em um com o Brasil, e veremos mais e mais tratados bilaterais. Então, o dólar permanecerá como a principal moeda internacional, mas o seu uso vai cair. Acho que um mundo de relações bilaterais é menos desejável do que a continuação de um sistema multilateral. Mas a estrutura que possuímos agora já se desintegrou, só que ainda não nos demos conta. É necessário criar um novo, e esta é a hora de fazê-lo.

PERGUNTA - Sobre os EUA, quão preocupado o senhor está com o deficit orçamentário e a inflação?
SOROS - Certamente, uma queda no valor do dólar é necessária para compensar o fato de que a economia americana continuará enfraquecida e será um peso para a economia mundial. A China emergirá como motor, no lugar do consumo dos EUA, e, lógico, é um motor menor porque a economia chinesa é muito menor.
Então, a economia mundial terá um motor menos potente e vai se movimentar mais devagar do que nos últimos 25 anos. Mas a China será o motor puxando-a, e os EUA serão um peso arrastado durante a gradual queda do valor do dólar.

PERGUNTA - Parece haver, especialmente em Wall Street, uma recuperação. Quão real ela é?
SOROS - No mercado de ações é bem real. Temos tido uma boa alta porque uma imensa quantia de dinheiro está nas beiradas sem render nada e gradualmente está sendo sugada para dentro do mercado. Provavelmente, o processo vai seguir pelo resto do ano.

PERGUNTA - O sr. espera que o mercado siga subindo até o fim do ano?
SOROS - Não é possível fazer previsões sobre isso. Nunca se sabe quando a virada vem, mas parece que é por aí, porque a falta de recuperação no mercado de trabalho vai garantir que as taxas de juros não sejam elevadas. E, ao mesmo tempo, os lucros estão razoavelmente bons e há um monte de dinheiro nas beiradas. Por isso, acho que essas são condições favoráveis para a contínua recuperação do mercado de agora até o final do ano.
No entanto, a economia seguirá necessitando de estímulos adicionais, porque a recuperação está sendo basicamente sustentada por transferências, pelos pagamentos e deficits que o governo administra. Caso sejam retirados, teríamos uma desaceleração dupla na economia. Para evitar isso, é preciso que os incentivos continuem. Porém, se isso é politicamente possível ou não ainda é preciso esperar, porque não dá para ficar acumulado dívidas que significam uma sobrecarga para as futuras gerações. Mas a alternativa seria outra recessão ou uma recessão mais longa.